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sábado, 20 de abril de 2019

Em defesa do indefensível

"Será o fim do mundo? Segundo a lei da Ciência Biológica, acasalamento se dá entre macho e fêmea. Homem com homem, mulher com mulher, será o fim da espécie humana!". O trecho exposto foi retirado de um comentário presente em uma noticia de 2011, de um jornal local de Franca sobre o primeiro casamento gay ocorrido na cidade, mas poderia, perfeitamente, ter sido lido em qualquer outra reportagem que aborde esse assunto atualmente. Os pressupostos e perspectivas que circundam as mentalidades por traz desse tipo de pensamento são, perceptivelmente, baseados numa lógica de racionalidade restrita e imediata de pensar, assim como aquela que permeia o positivismo. Torna-se  necessário compreender ( por mais difícil que seja) que  aqueles que possuem esses posicionamentos consideram suas bases  legítimas, cientificamente comprováveis.

Para que essa compreensão seja  direcionada a sua completude total é necessário adentrar no íntimo, no cerne desse "submundo", no qual se desenvolvem tais opiniões (lê-se atrocidades) . Uma porta de entrada possível para esse universo paralelo (paralelo para alguns e universo próprio para outros) é tentar entender o  que há por  trás do pensamento de Olavo de Carvalho, exaustivamente repetido em seu texto Mentiras gays, presente no livro O Imbecil Coletivo. O autor, buscando  desconstruir e desmentir o que ele concebe como mitos propagados pela comunidades gays , elabora sua tese de argumentos  a partir de uma análise sequencial dos pontos que ele considera mais relevantes para  serem discutidos. Inicia sua árdua tarefa com o propósito de dissolver as crenças em torno da falácia de que os homossexuais  são marginalizados , perseguidos e superiores intelectualmente, utiliza para isso fatos históricos, jogos de lógica.  Sua segunda empreitada é na defesa de que a heterossexualidade , diferentemente da homossexualidade, é uma necessidade para a preservação da espécie e não uma opção, um desejo de determinado grupo, ou a busca por um prazer inteiramente desnecessário, determinando, com isso, a indevida tentativa de se atribuir um mesmo valor para  uma necessidade  e um mero gosto.  Além disso, discorre  sobre a normalidade ou anormalidade das relações homoafetivas, e também sobre a infeliz e injusta tendência que os homossexuais possuem de taxar como preconceito qualquer opinião contrária a sua conduta ou que a considere como imoral. Refuta, indiscriminadamente, a pretensão de legislações específicas para defesa dessa comunidade e também a "exigência" desse grupo  de introduzir às crianças suas doutrinas e preferências. Mas apesar de tudo, defende que os gays também tem direitos, melhor dizendo, um único e suficiente direito:  sua conduta sexual privada não pode acarretar discriminações no emprego ou na vida social em geral. O que mais eles poderiam requerer? Um único direito é muito mais do que eles realmente precisam. Correto? Para Olavo de Carvalho, infelizmente, sim.

Amparado em um óptica positivista, que privilegia a rigorosidade do método, um conhecimento estritamente científico, a objetividade científica e  que julga conhecer a realidade na sua imediaticidade, o autor desenvolve suas teorizações. A concepção imediatista, em especial,  é notadamente relevante nas percepções de Olavo de Carvalho acerca dos homossexuais, não há uma tentativa de compreensão dos aspectos mais profundos que envolvem a realidade dessa comunidade, há apenas um enfoque  no presente do tempo. Sua tentativa de esclarecer e desmentir "mentiras gays" pode ser vista como uma defesa da família "tradicional", da qual ele faz parte , formada por um homem e uma mulher, e que , dentro de uma perspectiva positiva, representa uma das principais instituições mantedoras da ordem em uma sociedade,  sendo uma fonte da cultura, da moral predominantemente aceita, favorecendo, com isso, a perpetuação dessa ordem. Todas as críticas à homossexualidade e defesas à heterossexualidade  como superior, são , dentro da mentalidade  desse autor, cientificamente legítimas,  concebíveis  a partir de seu ponto de vista, que enxerga a realidade de maneira a justificar os seus direcionamentos.

A máxima defesa que, portanto, se pode oferecer aos detentores de posicionamentos voltados à recusa da ampla liberdade de expressão de todas as formas de sexualidade é que, por mais contraditórios que possam ser, estão justificados dentro da sua própria maneira de pensar, de compreensão.  A exemplo de Olavo de Carvalho, que constrói seus fundamentos  apoiado dentro da visão positivista, na qual as ideias se reduzem à automatização, à instrumentalização do imediato e a racionalidade se reduz à técnica , tornando-se predeterminada e perdendo, com isso, seu valor crítico e revelador da verdadeira realidade.

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