Durkheim tem a concepção de Direito como coisa social,
responsável por demonstrar a força da sociedade preocupada com a efetivação dos
compromissos sociais. Ele faz uma divisão em Direito Repressivo e Direito Restitutivo.
Enquanto este é baseado em regras morais não constituintes da consciência
coletiva, sendo passível de discussão e alteração( e cria instituições
particulares para sua aplicação) aquele é fundamentado na opinião pública, não
aceitando divergência dos costumes, e é difundido por todos indivíduos do corpo
social.
O equilíbrio entre essas duas esferas seria o ideal para gerir
uma sociedade moderna como a nossa, que possui uma individualidade nos ofícios
dos cidadãos, regulada pela solidariedade orgânica, uma vez que essas diversas
funções sociais são interdependentes e complementares.
Entretanto, na sociedade brasileira vemos que o Direito
Repressivo tem uma crescente ascensão ao se observar a ânsia de justiça diante
de um sentimento de impunidade. Mesmo que sua aplicação seja desproporcional ao
delito e que mais sirva para fazer ressoar o que a violação da norma pode
proporcionar do que gerar resultados efetivos, seu caráter imediatista fornece
caminhos para uma fácil adesão.
O povo brasileiro hoje revive a sensação do segundo governo
de Getúlio Vargas de o país estar em um “mar de lama”, ou seja, afundado em
escândalos de corrupção que envolvem até os mais altos líderes populistas como
em 1954. Por isso, clama pelo punitivismo nas ruas sem se importar com as
irregularidades do processo e com a perda de princípios fundamentais dos
Direitos Humanos, como a presunção de inocência, por exemplo.
O suicídio de Vargas moveu multidões em um cortejo; o
julgamento do Habeas Corpus do
ex-presidente Lula evidenciou uma divisão da sociedade entre aqueles que eram a
favor e os que eram contra a sua concessão. O populismo dessas figuras fez com
que as acusações de corrupção fossem abafadas diante das conquistas sociais por
parte da população. A diferença é que, na atual conjectura, parcela da nação
não tolera mais o bordão “rouba, mas faz” e busca uma condenação, mesmo que
inconstitucional, não apenas para penalizar, mas para demonstrar que até mesmo
os mais altos cargos são passíveis de pena.
Essa fragmentação da sociedade gera um momentâneo estado do
que Durkheim chamaria de anomia social, ou seja, uma ausência de ordem. Uma vez
que há uma desintegração, o desrespeito às regras e práticas da consciência coletiva
se torna facilmente realidade e prejudica o funcionamento da estrutura social. Tal
prejuízo fica evidente com os casos de pichação de Instituições Públicas, atos
violentos entre pessoas com opiniões divergentes, ofensas infundamentadas e
publicação de notícias falsas (Fake News) vivenciados mais arduamente no
período entre a emissão do mandato e a apresentação de Lula à Polícia Federal.
Portanto, a função do Direito se perde em meio ao
punitivismo presente na consciência coletiva, evidenciando seu caráter difuso.
Devido a sua rapidez e facilidade se comparado com uma readequação do sistema,
a punição diante de uma crise econômica e política é aclamada por uma
população, que se coloca em estado de anomia ao desintegrar-se e deixar de
cumprir as funções sociais estabelecidas pela consciência coletiva.
Alice Maria Silva Pires, Direito NoturnoTurma XXXV
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