Total de visualizações de página (desde out/2009)

domingo, 8 de abril de 2018

A Impunidade Como Normalidade


O Brasil nos últimos anos vem sendo palco de uma serie de escândalos de corrupção, alguns elencados pelas maiores figuras da politica nacional e o futebol que outrora transitava nas bocas dos populares como sendo o tema de maior de discussão nos bares, redes sociais e almoços em família agora se vê substituído por temas, como politica, economia e direito penal. Temas esses bem mais complexos, mas que são tratados com a mesma paixão e por vezes com a mesma logica simplista que outrora se dedicava ao futebol, porem uma certa necessidade de demostrar opinião e entendimento cresce no coração de cada cidadão que dotado de um senso de justiça quase inexplicável clama por punição ou absolvição de determinadas figuras politicas.

Um dos grandes propósitos da pena criminal consiste na logica de suprimir um impulso, uma vontade ou necessidade de cometer um ato, que esteja prescrito nas leis como crime, para que não sejamos no futuro punidos por tal. Nada mais nada que a logica da recompensa, às avessas, não cometa um crime e não vá para a cadeia, um postulado simples, de fácil entendimento e que se difunde dentro do senso comum.  Tal conceito que se vê presente na mente de populares país a fora já remontava também na cabeça de Durkheim na forma da sua dita “solidariedade mecânica” onde o medo da pena vem atuar como medida coercitiva e disciplinadora dentro da sociedade.

Mas e quando a eficiência dessa solidariedade mecânica se perde? E o medo da punição que outrora regia o bom andamento social acaba sendo substituído pela certeza da impunidade?  Hora se o meio molda o individuo tal qual ele é, quais as influencias que um meio contaminado com a incerteza da justiça traz a este individuo? Ainda mais quando os exemplos de maior monta de impunidade são de figuras de destaque social, como políticos.

Em 1976 Gerson de Oliveira Nunes, estrela do futebol que ajudou o Brasil a alcançar o tricampeonato mundial, consagrava durante uma propaganda de cigarros a celebre frase “-Gosto de levar vantagem em tudo, leve vantagem você também...”, tal frase veio a consagrar o dito jeitinho brasileiro, fundando até a chamada “lei Gerson”, que nada mais é do que o postulado de sempre tirar proveito e vantagens das situações a sua volta, mesmo que isso signifique determinado prejuízo a outro.  Ora arrisco-me aqui a dizer que tal comportamento de “buscar levar vantagem em tudo” nada mais é do que um reflexo evidente do comportamento social dos nossos exemplos, sejam eles jogadores de futebol externando tal pensamento em rede televisão aberta, ou de nossos políticos que se mostram mais preocupados consigo mesmo, aproveitando de cada brecha legal para satisfazer seus anseios pessoais, mesmo que à custa de dinheiro publico e que no final saem impunes por manobras legais protelatórias, somente possíveis por conta das brechas legais existentes na lei que eles mesmos controlam.

Ainda neste contexto uma das frases que se consagraram dentro da logica de defesa de determinadas figuras politicas envolvidas em escândalos de corrupção, principalmente entre as massas menos cultas, é a logica que podemos definir como “rouba mas faz”, que parte da premissa que todos os políticos roubam então esse fato é aceitável e normal, logo um politico que rouba mas que acaba aprovando algumas medidas para o bem publico deve ser defendido. Embora seja extremamente desconfortável conceber tal logica, esta é bem difundida o que vem a demostrar os riscos que a impunidade vem trazer, dentre eles a normatividade do ato delituoso.  E assim temos um ciclo vicioso, políticos corruptos impunes, inspiram novos políticos a também serem corruptos e eleitores que além de se contaminar com essa logica de ser normal a pratica de delitos ainda reelegem tais indivíduos , por acreditar que todos os dentro da politica são iguais.

Não quero com isso legitimar o punitivismo como solução final para todos os problemas, até porque tal ideia pode ser a porta de entrada para uma grande anomia social, seja pelo risco do ideal punitivista como solução a todos os problemas da nação, fato este que cresce na mídia e nas discussões simplistas, muita das vezes por pessoas que desconhecem os preceitos legais e os princípios sociais que se põem em perigo com o avanço deste ideal de punição. Outro grande risco que advém do crescimento do punitivismo é o agigantamento do Judiciário sobre os outros poderes, o que pode ser a porta de entrada para legitimação de abusos a direitos e o vultoso risco derrocada do estado democrático de direito.

Porem é necessário que o estado se mostre presente e capaz de coibir a impunidade em todas as esferas, justamente para que não exista um rompimento da coesão social e o declínio da legitimidade de nossas instituições democráticas. Outro fator também fundamental para coibir os malefícios da impunidade e do pensamento maquiavélico de ignorar o outro em prol de si mesmo, é nada mais do que o bom exemplo, que pode e deve ser advindo de cada um de nós, ora, pois, se o ambiente tem a capacidade de influenciar os indivíduos o exemplo, que parte de cada um, quando expandido a todo um conjunto social acaba por influenciar todos os seus membros a adotar também boas praticas.

 A corrupção que se alastra aos níveis mais altos pode e deve ser limitada desde suas origens mais rasas e desconsideráveis. Não existe diferença moral no ato de se apropriar ilegalmente de um carro publico ou de um simples grampeador de papel, a final ambos são bem públicos. Não há diferença na moralidade do individuo que na firma em qual esta empregado se apropria de um maço de folhas para executar um trabalho acadêmico, de um deputado que se utiliza de verbas do gabinete para desfrutar das férias.  Porem esses pequenos atos como se apropriar de uma caneta ou de um maço de folhas não necessariamente devem ser coibidos com a força da lei e sim com o exemplo social. A logica de que todos fazem isso então é normal e aceitável deve ser removida de nossas vidas e esse pequeno ato de mudar a sociedade com base no exemplo parte de cada um.

O tênue equilíbrio entre estado garantidor de direito e capaz de levar a justiça a todos, independente de quem o seja, aliado a uma sociedade com indivíduos que se preocupem com o efeito que suas ações têm para o bem estar social da maioria é o que constrói os pilares da real justiça e equidade.

Denis Cunha
Turma XXXV 
Direito (Noturno)

Nenhum comentário:

Postar um comentário