Marx, ainda hoje, se apresenta extremamente
relevante na análise de casos do cotidiano. Em sua obra “Crítica da Filosofia
do Direito de Hegel”, de 1843, analisa o pensamento hegeliano, indo contra as
ideias do antigo pensador, ao afirmar que o Estado, e consequentemente o
Direito advindo dele, são todos voltados para a classe privilegiada – a burguesia
– para que essa possa conquistar todo o desejado em detrimento da classe
trabalhadora, sem qualquer impedimento. Assim, o Direito opera única e
exclusivamente visando os interesses da classe burguesa. Ao colocarmos esse
pensamento no exame do caso Pinheirinho, uma fazenda “invadida” por moradores
sem onde morar, pertencente à massa falida da Selecta S/A, empresa do
empresário Naji Nahas – mestre da especulação imobiliária e apontado como principal
responsável pela quebra da Bolsa do Rio, em 1989 – observamos, como dito no
início, a contemporaneidade do pensamento marxista.
As terras eram improdutivas desde 1978, e assim se
mantiveram até 2004, quando moradores sem teto cansaram da demora de
providências do Estado na resolução desse problema e ocuparam a área. Ficaram
até 2012, ou seja, oito anos em que se desenvolveram e onde mais de 5000
pessoas construíram suas vidas, se firmaram, encontraram um lugar em um mundo
tão desigual. A demora na justiça para a conclusão de todos os trâmites, as
idas e vindas, foi cruel, e tornou a dor de deixar o local ainda pior. Por aí,
já iniciamos com Marx: não houve qualquer preocupação social na demora do
julgamento. Obviamente, juízes que lançaram as liminares não sofrem das mesmas
condições e não possuem o mesmo olhar que as pessoas moradoras do Pinheirinho,
trabalhando, ainda de acordo com Marx, sob a ótica burguesa. A juíza Márcia
Loureiro, responsável pela última liminar favorável à reintegração de posse,
correu para justificar a exagerada demora no processo. Além disso, julgou algo
já julgado, indo completamente contra princípios que devem ser respeitados
pelos juízes de direito. Sua atitude foi, inclusive, contestada pela própria
Ordem dos Advogados do Brasil. É lamentável que a reintegração de posse tenha
acontecido mesmo dessa forma.
Em uma entrevista concedida ao jornal O Vale
(abaixo), Márcia – perceptivelmente com o olhar da classe dominante,
principalmente ao afirmar: “Eu não poderia dizer que o particular tem de fazer
as vezes do poder público e providenciar moradia pra diminuir o déficit
habitacional”– ainda diz que a operação de desocupação foi um sucesso, mesmo
com vários feridos, bens destruídos, e até mesmo mortes. Estaria a juíza a par
de toda a situação? Seria o Direito somente operado, liminares decretadas e todo
o resto – principalmente, o social – deixado de lado? Marx tem razão? O terreno
foi desocupado, as famílias foram retiradas e tudo demolido. Permaneceram meses
em abrigos, sem quaisquer condições. Cadê a juíza Márcia exigindo melhores
condições para essas famílias? O interesse, claro, era somente em defender uma
empresa falida, que deve milhões ao Estado – dívida essa, pasmem, que será
abatida –, e que possui o terreno somente como especulação. Resultado? A terra de
1,3 milhões de m² está lá, quase quatro anos após a desocupação, parada, sem
papel social, como prega a Constituição. Enquanto isso, a cidade procura um
lugar para a construção de um hospital e 30 mil famílias aguardam na fila por
uma casa. Resumindo, o Direito todo esteve em prol de um único homem, devedor,
sem credores, o qual usará a área exclusivamente para o aumento de seu patrimônio.
Infelizmente, Marx tinha razão.
Arthur Augusto Zangrandi
1º ano Direito noturno
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