O
Direito, objeto difícil de ser conceituado, mensurado e compreendido, diversas
vezes se depara com situações conflituosas e desagradáveis, o que torna a
situação um tanto complicada de se resolver. O Direito, para Hegel é tomada
como forma de garantir e estabelecer a liberdade entre os homens, uma vez que
este emana do Estado através da vontade geral racionalizada, impedindo o império
do homem sobre outro homem, como ocorria no feudalismo. Somente submetido a lei
os homens podem ser felizes, pois, sob seu amparo estarão seguros para a
realização das atividades sócias, mantendo o “autocontrole” formalizado em lei.
Criticando
o pensamento hegeliano, Marx aceitava que filosoficamente o Direito é
maravilhoso, porém, não se sustenta materialmente e historicamente,
considerando que, embora a lei seja “igual” para todos, nem todos possuem as
mesmas condições, capacidades e talentos. Desse modo, o Estado de Direito
hegeliano é uma abstração, algo ilusório, que não se concretiza na realidade, e
que, além disso, é utilizado de maneira a garantir a hegemonia da classe
dominante, a classe burguesa, que positiva o Direito em favor de seus
interesses para legitimar sua dominação e exploração sobre o proletariado.
Tendo
breve conhecimento dessas correntes de pensamento, podemos analisar, sob a
ótica do Direito para Marx, a penosa manifestação do Direito e a grande
injustiça ocorrida no Massacre do Pinheirinho. No ano de 2004, na cidade de São José dos
Campos, em uma fazenda pertencente a Massa Falida da SELECTA S/A, a qual estava
abandonada e consequentemente improdutiva e deixada ao relento, diversas
pessoas sem-teto se instalaram no local. Aproveitando as condições do lugar para
se estabelecer, na tentativa de seguir os padrões de vida da sociedade humana,
estabeleceram moradias, se é que se pode considerar as condições ali estabelecidas
de uma moradia digna, considerando a falta de energia e saneamento básico,
dentre outros serviços. Estes moradores, até o fatal ocorrido em 2012, seguiram
suas vidas ali estabelecidos, formou-se uma comunidade com cerca de 1600
famílias, mesmo de que maneira irregular para o Direito posto no Brasil. Até
que em uma infeliz reabertura do caso judicial, foi decretado a reintegração de
posse a massa falida, o que culminou no infeliz massacre, despejando os
moradores, causando mortes, perda de bens, demolição de suas “moradias”,
desrespeito aos Direitos Humanos e nenhuma preocupação com essas famílias.
O
que teria levado a reabertura do caso? O que teria ocasionado a gritante
parcialidade por parte dos juízes quanto a questão, uma vez que o direito de
propriedade está resguardado no mesmo âmbito que o direito de moradia? É
evidente o privilégio dado à propriedade em detrimento da “moradia” dessas
famílias. A força foi usada para o despejo, mas o bom senso sequer deu a devida
atenção à história ali construída pelos moradores, o Direito Constitucional à
moradia a todos os cidadãos brasileiros não está sendo efetivado pelo Estado, e
quando o povo luta pela conquista de um lugar para ficar, o Estado age contra a
sua Constituição, privando-os daquela moradia. É claro o privilégio do Direito à
burguesia, uma vez que a moradia resguardada pelo Estado só é legítima para
eles quando conseguida através do sistema capitalista, desconsiderando que esse
sistema criou as condições de pobreza dessas pessoas ao ponto de não terem onde
morar, desconsiderando também que essas pessoas estão historicamente e
economicamente atrasadas em relação aqueles que tudo tiveram para conseguir
seus direitos.
Para
muitos brasileiros, o fato de grupos sem-teto como o MST, reivindicarem seus Direitos
através do “radicalismo”, como as invasões a terras improdutivas, é mais do que
suficiente para considera-los criminosos. Mas, de que maneira essas pessoas
conseguirão seus Direitos atendidos com a urgência de sua demanda? Ficarão esperando
a boa vontade do Estado? E enquanto isso não é conseguido, ficarão dormindo na
rua sob condições desumanas? De acordo com a teoria marxista, o Direito é um
instrumento de dominação político-social da burguesia que enche o bolso ao
passo que o pobre passa fome e não tem onde morar. A revolução proletária seria
o meio de acabar com esse Estado de Direito através da conscientização proletária,
tornando visível a todos as necessidades de todos, sem a necessidade de uma
força estatal para manter a ordem, ou melhor, a ordem burguesa. Porém, não acho
que esse meio seja possível atualmente, ainda mais levando em conta a época e o
país em que estamos, quadro que apresenta diferente disposições que Marx
encontrou.
O
Direito é burguês, mas pode ser usado de maneira contra hegemônica, o Direito
pode ser usado com um viés social, a garantir a justiça, usando-o
alternativamente daquilo que se encontra enraizado no ordenamento jurídico
brasileiro atualmente. Isso não está longe de ser concebido, podemos observar
essas características na própria Reclamação Disciplinar feita pela ADMS e Terra
de Direitos, contra os juízes envolvidos no caso Pinheirinho, configurando um
exemplo de como o Direito pode sim fazer justiça e ser utilizado contra os
privilégios da burguesia conferido pelos juízes envolvidos no caso. Levando em
conta que tanto o direito de propriedade e o de moradia estão resguardados pela
Constituição Federal de 1988, por que não garantir ambos os direitos? A
magistratura deve dar solução aos casos, com imparcialidade, sem privilegiar
alguma das partes. Um acordo seria necessário, várias opções de solução
existem, basta encontra-las da melhor maneira possível. Quanto a uma solução em
especial, penso em uma indenização por parte do Estado ao proprietário e
integração dos moradores aos serviços públicos necessários à comunidade, ou até
mesmo a devolução da área ao proprietário falido, desde que casas populares
sejam construídas para esses moradores que tanto sofreram para conseguir o seu
lugar, o seu lar. Entretanto, fatores econômicos podem falar mais alto para o
Estado, o que configuraria mais uma injustiça criada pela sociedade burguesa de
hiper valorização do capital e desvalorização do ser humano.
Gabriel Magalhães Lopes
1º ano de Direito Noturno
Caso Pinheirinho sob a ótica marxista
Nenhum comentário:
Postar um comentário