Em
2012 ocorreu a desapropriação de um terreno invadido em São José
dos Campos, interior paulista. Caso este que provocou peculiar
repercussão midiática. A seguir serão expostas algumas opiniões
sobre o assunto, cada uma com um viés ideológico de relevante
interesse para análise do caso.
PARTE
I
Convém
admitir que a sentença do caso Pinheirinho não é, efetivamente,
contrária à norma, estando inserida naquilo que a legislação
brasileira prevê. Ocorre que há aqueles que buscam em qualquer
situação aplicar teorias que dividem a sociedade. Ao clamar por
Marx, apontam em tudo a guerra de classes. Afirmam estar diante de
mais um caso onde o Direito foi instrumento de dominação burguesa.
Rotulam: “ricos contra pobres”. Não percebem que na realidade os
detentores de capital e aqueles que vendem sua força de trabalho
vivem uma relação de interdependência, de convergência de
interesses. O Direito é para todos. Como está estabelecido pela
Constituição do país não há distinção entre os homens – o
Princípio da Isonomia. Ao Poder Judiciário coube apenas zelar por
seu cumprimento, a garantia da propriedade privada. É bem verdade
que criou-se um conflito com o Princípio da Dignidade da Pessoa
Humana, mas é evidente que aquele prevalece quando o cumprimento
deste exige a desordem. Não está gravado na bandeira da pátria
“Ordem e Progresso”? Como seria feita justiça se não se
respeitasse o direito à propriedade? Este é o Princípio em que se
baseia a sociedade. Não se pode negar a natureza ilegal do ato
julgado: se apossar do que não lhe pertence é crime desde os tempos
mais primitivos. Aqueles que não concordam tratem de fazer sua
revolução, pois enquanto vigorar o sistema natural não cabe
nenhuma reivindicação à norma sobre a qual se formou a
civilização.
Cabe
aqui um comentário sobre o procedimento do caso. Fica evidente pela
reclamação colegiada, que regimento ignorado, e a burocracia
estabelecida foi burlada para obter maior agilidade. Embora a decisão
tenha sido correta, um conluio foi arquitetado. Não resta dúvida de
que os envolvidos devem ser julgados, e confirmando a denúncia,
recebam merecida disciplina. Do mesmo modo cabe à Polícia
sindicância interna, mas não se ignore que a natureza ilícita do
ato não invalida a força empregada, que se fez necessária. Uma vez
mais se destaca a necessidade da Ordem preceder o Progresso. No mais
não há o que desqualificar. Ora, não cabe ao Judiciário tarefas
competentes ao Executivo e Legislativo, de organizar e viabilizar o
acesso à moradia e aos serviços públicos. Cabe a ele tão somente
a guarda da Constituição. Lembre-se que o problema da moradia é
complexo, e exige intensa ação conjunta dos três Poderes, mas
sobretudo dos dois que possuem representantes populares, avaliando
cuidadosamente o modo mais justo de viabilizá-la, respeitando a
vontade do povo. Como poderiam juristas legislar tal demanda sem
cooperação dos demais? Cabe a sociedade exigir que seus eleitos
cessem de se esquivar de suas responsabilidades. Que cada um assuma
seu papel. Incluindo também a própria sociedade. Pois se buscasse
com mais afinco o exercício da cidadania, certamente que a maioria
dos parasitas que hoje ocupam a máquina pública não teriam espaço
para se proliferar.
PARTE
II
Chega
a ser absurdo qualquer tentativa de defender o massacre do
Pinheirinho. O injustificável ocorreu, e infelizmente continua a se
repetir, pois sua essência está ligada aos interesses burgueses.
Esses que utilizam o Direito para se defender. Uma vez mais a luta de
classes, que permeia toda a história da humanidade se manifesta.
Como negar que o conluio praticado atendeu os interesses da SELECTA
COMÉRCIO E INDÚSTRIA S/A, em vista de sua influência e poder,
ainda que isso implicasse no desrespeito a legislação vigente? Não
basta que a Lei seja utilizada para impor a todos o domínio burguês,
quando lhes convém, deixam de lado a norma para oprimir os indefesos
para lucrar com isso. Ficou mais que provado que os marginalizados
eram pessoas honestas, e buscavam, com os poucos recursos que
possuíam, trabalhar arduamente para prover seu sustento. Em vista do
deficit habitacional ignorado cruelmente pelo Estado, os explorados
viram naquele espaço abandonado a fonte digna de seu sustento, e
mais que isso, o cumprimento da função social da terra, como
previsto em Lei. Todavia isso tudo foi ignorado quando o interesse
dos donos do capital adentra a disputa. Não observando que os pobres
ocupavam a região há mais de 7 anos, e já haviam criado normas de
convivência de acordo com a norma do Estado, que já haviam criado
vínculos com aquela terra, ou ainda que esse mesmo Estado não
tivesse preparado qualquer estrutura para recebê-los. Vale ressaltar
que já eram negociadas condições dignas da desapropriação,
respeitando os humanos que ali viviam, e que seriam deslocados para
uma área destinada para tal pelo Poder Executivo. No entanto, em
mais um gesto opressor, a Polícia foi acionada, agindo com tamanha
desproporção que levou a óbito dois moradores. Como pode ser isso
considerado justo? É ilógico, é o atestado de falha da humanidade,
de como os valores estão distorcidos pela ganância que o capital
produz. Com pode alguém, seguindo a Filosofia do Direito de Hegel
apontar que isso é aceitável. Como negar a tendência do Direito em
defender os interesses burgueses? Qual o Progresso que se consegue ao
seguir essa Ordem?
PARTE
III
Contrapondo-se
tese e antítese anteriormente apresentadas, pode-se chegar a algumas
conclusões. Primeiramente destaca-se a atuação vergonhosa dos
agentes do Direito, sendo necessário aplicação de disciplina e
diálogo institucional. Em segundo, vale ressaltar que a Constituição
equipara os dois princípios em conflito: a Propriedade Privada e a
Dignidade da Pessoa Humana, no qual a moradia está inclusa, além
dos pactos internacionais que o Brasil é signatário que buscam a
preservação da vida, cabendo então ao juiz avaliar as
particularidades do caso. Assim não é possível afirmar que a
sentença foi ilegal ao privilegiar o primeiro, ou que seria se
optasse pelo segundo. Havia também o agravante de que o proprietário
não estava com os impostos quitados, sendo compreensível a
exigência da terra como pagamento dos débitos, o que certamente
seria a opção mais humanitária. Todavia não se deve negar a
essência patrimonialista que permeia os códigos, e que a defesa da
propriedade privada se faz necessária para aqueles que ousem se
declarar como agente do Direito. Naturalmente essa última opção
exigiria um extraordinário esforço por parte do Poder Executivo,
para proporcionar uma estrutura adequada a cerca de 6000 pessoas. E
não se ignore que essa opção era negociada entre as partes.
Nesse
sentido é de extrema relevância mencionar o Direito Alternativo, o
uso do Direito como instrumento de transformação social, contra a
burguesia. A norma contida na Constituição, e os pactos a que o
Brasil é signatário são, se colocadas em práticas, mais que
suficientes para garantir uma sociedade mais justa, visto que a norma
máxima da nação está muito a frente do que a aplicação na
atualidade.
Jansen
R. Fernandes
Diurno
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