Ao analisar o caso da reintegração de posse da área da zona
Sul da cidade de São José dos Campos, no interior paulista, conhecida como “Pinheirinho”,
perceberemos as inúmeras contradições e paradoxos que envolveram esse caso, o
que culminou na ampla repercussão midiática acerca do ocorrido.
Enquanto os donos da terra reivindicavam seu direito à
propriedade, os ocupantes, por sua vez, exigiam a defesa do direito à moradia.
Esse impasse demonstra a ineficácia do pressuposto defendido por Hegel, segundo
o qual, o Estado, o Direito e sua racionalidade são responsáveis por assegurar
o autocontrole da liberdade humana. No progresso histórico, o homem tende a buscar
a plenitude de sua liberdade, segundo Hegel, logo ele tem repletas condições de
conquistar suas terras, assim como sua moradia. Todavia, o desfecho do caso “Pinheirinho”
mostrou que essa visão hegeliana de imparcialidade, universalidade do Direito
se mostra equivocada. Por que o direito à
propriedade dos donos da terra foram priorizados pela juíza em
detrimento dos sem-terra? Numa visão marxista, a parcialidade da juíza, negando a isonomia do Direito tão cara a Hegel, é condicionada pela elite econômica
que se posiciona no topo da hierarquia social, determinando, segundo seus
interesses, toda a superestrutura
estatal; na qual o Direito, portanto, se insere.
Nesse ínterim, o Direito se afasta da racionalidade tão
valorizada por Hegel. Onde estaria a racionalidade do Direito quando ele
torna-se instrumento para expulsar e dizimar famílias que apenas desejavam um
lar? O massacre do Pinheirinho parece uma repetição atual da chacina de Canudos
do século XIX. Na comunidade de Antônio Conselheiro, o Estado era dominado pele
elite agrária, e, hoje, ele continua subordinado pela mesma classe privilegiada, pelos
detentores dos meio de produção que o manipulam com o único intuito de se
beneficiar. Nessas condições, a meritocracia, a racionalidade, a isonomia do
Direito são religiões, não passam de utopias,
conforme Marx apontara.
O caso do “Pinheirinho” traz à tona uma dos questionamentos
mais polêmicos e controversos do âmbito jurídico: o Direito deve ser puramente
racional ou ter um grande apelo social e humanitário? Na Roma Antiga, Celso o
classificava como a “arte do bom e do justo”, apesar de hoje o Direito se reaproximar
sutilmente dessa concepção com a valorização dos Direitos Humanos, sobretudo da
dignidade da pessoa humana; de maneira geral, ele adquiriu um forte teor
elitista, parcial, segregante. Acreditar que isso deve e irá mudar seria um ópio ou uma esperança ?
Victória Afonso Pastori
1º Ano-Direito Noturno
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