É
inegável que vivemos em uma era fortemente marcada pela judicialização da
política, em que todas as questões relevantes como o aborto e o casamento gay,
por omissão do legislativo que cada vez mais se limita a aprovar medidas
provisórias, são discutidas no judiciário, além de haver forte presença do
ativismo judicial: da escolha de um modo de interpretação da Constituição que aperfeiçoe
o princípio da dignidade da pessoa humana. É neste sentido que assistimos a
precípuos avanços da democracia por meio de decisões do STF e regressões
absurdas no Congresso, cada vez mais conservador.
Destarte,
embora provada a importância da judicialização da política numa era de
esvaziamento onde o povo não sabe eleger seus representantes, em que o
Congresso é marcado pro analfabetos e covardes que ganham votos atacando
minorias, levanta-se a questão do embasamento democrático desta judicialização
que, quiçá, leva ao âmbito do judiciário questões de competência do
legislativo. O judiciário, porém, é procurado a se manifestar acerca de
questões fundamentais, não podendo negar-se a tal como guardião da
Constituição; a ação do magistrado é respaldada na soberania popular, emana do
povo e em seu nome é exercido; assim, a judicialização é antes garantia da democracia
quando o legislativo se mostra esvaziado e incompetente.
Um
dos maiores exemplos dos benefícios à democracia promovidos pela judicialização
diz respeito à ADPF 186, responsável por decidir acerca da constitucionalidade
das cotas raciais; Decidiu-se pela constitucionalidade desta em razão de não
promover à desigualdade, como defendido pelo partido DEM, mas de promover a
igualdade, visto que o racismo faz com que os negros sejam relegados a
trabalhos de menor valor econômico, em cujas oportunidades são escassas,
fazendo com que o vestibular, responsável por medir o investimento e não a
capacidade, se torne uma forma de garantir vagas para a elite branca e manter o
negro na periferia, assegurando a estratificação social.
Nesta
decisão, o judiciário foi contra a maioria, contra os valores dominantes para
aplicar os princípios da razão pública, defendidos pelo ministro Barrosos como
indispensáveis; deixou de lado a interpretação conservadora da Constituição
defendida pelo partido DEM, abrindo acesso a um dos ambientes intelectuais mais
importantes do país para um grupo social marginalizado, permitindo assim a
superação de desigualdades históricas.
Dana Rocha Silveira - Direito Noturno
Dana Rocha Silveira - Direito Noturno
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