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sábado, 4 de julho de 2015

Homem< Sistema do Capital




Elegia 1938
Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações não encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.

Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
e sabes que, dormindo, os problemas te dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.

Caminhas entre mortos e com eles conversas
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.

Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.

Elegia 1938 (Poema da obra Sentimento do mundo), de Carlos Drummond de Andrade.
                                                                                             

Como afirma Drummond, os indivíduos vítimas da dialética do capitalismo, que produz em seus polos acumulação de riquezas e de misérias, ao mesmo tempo, veem-se pequenos, insignificantes fronte à Grande Máquina. Segundo, ainda discutido pelo filósofo Karl Marx, os homens fazem sua própria história, mas não do jeito que desejam, não a fazem sob circunstancia de sua escolha e sim sob aquelas legadas pelo passado. Isso demonstra que o homem é o maior construtor desse mundo, para o qual trabalha e, em consequência indireta, sente calor, frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual, o que denota sua incoerência, pois se ocupa com trabalhos que nada lhe oferece mas, ao contrário, lhe privam de verdadeiramente viver.

Não obstante, a sociedade descrita por Drummond muito se assemelha à sociedade contemporânea, a impotência é explícita e inevitável: Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra — única forma de fuga da realidade, dormindo, os problemas desaparecem. Porém, o subterfúgio é efêmero, dado que, ao despertar, tudo volta ao que era antes: a Grande Máquina, é real, posto que invisível, impalpável, o que dificulta uma possível luta contra ela. O ser humano, pequenino, se confronta com o sistema, grandioso. É a insignificância do homem, ante esse mundo, que, na verdade, sobressai.

Vale ainda ressaltar que contrariamente ao que diz o filosofo Engels, que o socialismo, é um percurso incontornável da história, um produto da luta de classe entre a burguesia e o proletariado, o que vê-se hoje, é a aceitação do homem da classe oprimida devido a sua impotência fronte ao grande sistema do capital, bastou-se infelizmente em conformar-se, adiar para outro século a felicidade coletiva, aceitar a chuva, contra a qual nada se pode fazer, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição, (contra as quais muito se poderia e pode fazer, mas se...), pois não é possível, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan, símbolo, no passado e mesmo agora, do sistema capitalista. O homem aceitou que resta, portanto, a revolta contida, a incapacidade, a frustração.

Heloisa C. Leonel
1º ano Direito Diurno

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