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quinta-feira, 23 de julho de 2020

O conservadorismo positivista de Olavo: mau caratismo ou ignorância?

Augusto Comte foi um filósofo francês do século XIX responsável pela criação da doutrina do Positivismo, bem como pela criação da disciplina acadêmica intitulada "Sociologia". A visão positivista da sociedade tem como norte a questão do progresso e da ordem, além de supostamente superar os outros estágios de pensamento humano, o teleológico e o metafísico, segundo o próprio Comte. Nessa medida, o pensamento positivista se atém à questões estáticas e conservadoras da moral e da própria sociedade, justamente por tentar se equiparar às chamadas ciências exatas, como a astronomia, a física e a matemática, portanto tentando transportar os princípios e regras imutáveis deste universo matemático ao universo social.
Contudo, principalmente hoje, vivemos em um mundo de nítidas variações sociais e morais, acordadas em uma interligação mundial entre as sociedades e pessoas, o que demonstra a fluidez e dinâmica espacial e social contemporânea, em oposição ao estatismo positivista. Muito embora essa larga evidência, há ainda a presença de indivíduos que se aliam a esse pensamento e tentam argumentar e orquestrar o mundo conforme os preceitos de Comte. Como exemplo, tomo o autor Olavo de Carvalho, em especial o seu texto "Mentiras Gays", para exemplificar o espécime de pensamento sugerido. 
Nesse texto, o autor trata sobre a homossexualidade de uma maneira extremamente torpe, grosseira, indelicada e conservadora, argumentando, em uma das passagens, que todos os direitos aos gays já são compridos e positivados. De fato, na Constituição brasileira de 1988 e no tratado dos Direitos Humanos de 1948 há a clara presença de um artigo conferindo o mesmo direito às pessoas independentemente de sua sexualidade, porém, na prática, sabe-se que os homossexuais são um grupo social extremamente oprimido. A questão é que o direito positivado na Constituição não reflete, necessariamente, a real condição presente, pois a ordem e a lei nem sempre são obedecidas e acatadas. 
Partindo desse ponto, o positivismo de Olavo se escancara na medida em que tenta organizar as relações sociais e afirmá-las categoricamente embasado em uma escritura vigente, sem de fato olhar para os acontecimentos sociais reais. Mais do que isso, o conservadorismo e o estatismo moral "olavista" acerca dos gays, na tentativa de condená-los como imorais e diferentes do "normal", revela o grande caráter positivista que pretende condenar a diversidade. 
Então, tal como Comte propunha em seu curso de filosofia positiva, Olavo se apoia no quesito da moral para tentar oprimir as minorias e enaltecer uma imagem de progresso, por sua vez amparada pela "função social" do indivíduo, a qual é, para Olavo, inexistente no tocante aos gays, visto que a impossibilidade de reprodução entre esses indivíduos os coloca abaixo dos heterossexuais, portanto sendo passível de supressão e demérito. 
O absurdo explicitado por Olavo, em acordo com alguns preceitos positivistas, toma como ápice a questão comum entre Comte e Carvalho acerca das vontades, subjetividades e afetos individuais como sendo desprezíveis em relação ao observável e científico. De tal maneira, retomo o exemplo da homossexualidade, denunciada por Olavo no texto "Mentiras Gays", no momento em que este diz que o desejo sexual pelo ente de mesmo sexo não é tão importante quanto a necessidade da heterossexualidade para a espécie humana, pois o primeiro se trata de apenas um desejo individual e o segundo de uma condição implacável da humanidade.
Por fim, a incapacidade positivista "olaviana" de lidar com a diversidade e a subjetividade humana demonstra a constante necessidade de se desconstruir discursos e ideias marcados por uma moral inflexível e de ordem excludente. A condição social dos Gays não é boa no Brasil, muito embora teoricamente preservada na Constituição Federal, pois esse grupo sofre com a presente violência  homofóbica conservadora da população, o que demonstra que os direitos não estão sendo efetivados. Adiciono ainda que a homossexualidade criticada por Olavo é tão natural e necessária quanto a heterossexualidade e que não se trata de um mero desejo, mas sim de uma necessidade do indivíduo de poder amar quem deseja e poder se relacionar livremente, tal como os demais podem. 
A única questão restante é se o autor assim o faz por ignorância e estupidez ou por mau caratismo. Na verdade, acho que é a soma de ambos.

João Cenamo Baldi de Freitas - 1º ano direito diurno

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