Um
assunto extremamente polêmico e em alta na sociedade brasileira é a questão das
cotas raciais para o ingresso dos negros nas Universidades Públicas do Brasil.
Muito se discute se essa ação afirmativa, com o intuito de promoção da
igualdade de fato, é a melhor medida a ser comtemplada e se ela é justa,
considerando o “privilégio” gerado por essa cota.
Grande
destaque obteve o caso da reserva de 20% das vagas da UnB para os negros, sendo
refutado pelo DEM, através de uma ADPF, descumprindo preceitos fundamentais da
Constituição Federal e do ordenamento jurídico brasileiro, combatendo esse
“privilégio” gerado por essa cota. Esse caso acabou por ser refutado, e é
importante ressaltar o parecer do Ministro do STF Ricardo Lewandowski,
rebatendo os argumentos da DEM em favor das cotas, ressaltando que a igualdade
constitucional está apenas formalizada em lei e, na tentativa de atingir a
igualdade de fato, é necessário criar meios de inclusão, como a cota racial e
as ações afirmativas em geral, para se atingir a igualdade material.
Boaventura
de Sousa Santos, ao analisar o direito como ferramenta de emancipação social ou
não, demostra que para o Direito ser emancipatório, é necessário sair da
concepção de Estado liberal e demo-socialista, sem ser levado pela agenda
conservadora, bem confundida com o neoliberalismo. Para Boaventura, a
emancipação social está atrelada a regulação social, o que gera a dialética
regulada. Hoje, o livre comércio e a instabilidade do mercado geram a
insegurança para o cidadão e enfraquece os sindicatos, fruto da reinvenção do
modo de produção capitalista, o que gera a desregulamentação e consequentemente
um entrave na emancipação social, o que prejudica a emancipação do negro, por
exemplo.
É
bem observável que o contrato social do cidadão com o Estado está em risco,
debilitando o papel do Estado de segurança e bem-estar social dos indivíduos,
deixando a população em um estado hobbesiano de competição e sobrevivência.
Dentro deste quadro social, o que resta para os excluídos como para a maioria
dos negros? Quais as chances de manutenção da vida dentro de um sistema em que
se vive em um “estado civil incivil”?
Muitos
irão dizer que a escravidão no Brasil já se encerrou, que eles já são livres e
que possuem as mesmas condições de todos igualmente de se desenvolver com
sucesso, e que, isso está constitucionalmente garantido para todos os
brasileiros. Mas, é evidente que há um legado da escravidão, afinal, o negro
ganhou a liberdade, mas que condições ele recebeu após a abolição? Que trabalho
e de que modo eles eram tratados? Seriam vistos de uma hora para outra da mesma
forma na sociedade? Passaram a desenvolver o comércio e possuírem meios de
produção? Onde foram viver? Nos centros das cidades ou criaram as suas
periferias?
Facilmente
se observa que a maioria dos negros não estão inseridos socialmente, como
Boaventura aponta, estes ainda passam pelo processo de exclusão, social e
economicamente, gerando a instabilidade social para manutenção da estabilidade
econômica do sistema capitalista, desse modo, eles se mantêm em um
pré-contratualismo, tendo, por esses fatores, o acesso a cidadania impedido,
tão almejada por qualquer um que possua a expectativa de ser cidadão, que mesmo
após o fim da escravidão, não se consolidou em sua maior parte.
Outro
ponto abordado por Boaventura é o fascismo social, este que controla a vida
pública e conseguiu implantar juntamente com o conservadorismo o senso comum do
povo brasileiro, o que também gera o apartheid social com a exclusão das
subclasses, como os negros. Este fascismo social impõe uma verdade total, e uma
vez que ela atinge o senso comum, tende a combater as “inverdades” que ameaçam
o que é “certo”, como a “igualdade formal” da constituição em face à tentativa
temporária de estabelecer a igualdade material através das cotas raciais, como
forma de inclusão do negro na sociedade civil através do maior acesso a
educação superior.
Assim,
Boaventura destaca também o cosmopolitismo subalterno, uma forma de
globalização contra hegemônica, concluindo que o Direito pode ser usado como
emancipação social de forma a se evitar a exclusão de certos grupos
minoritários.
As cotas raciais não são eternas, mas sim
medidas provisórias de emancipação social do negro enquanto grupo minoritário
que muito contribuiu para o desenvolvimento econômico do Brasil com a
escravatura, mas que, apesar de sua grande contribuição, através da exploração
sofrida não recebe muito do que deveria da sociedade, muito pelo contrário,
recebem uma enxurrada de discurso de ódio e racismo, sendo retratado como o
“vagabundo” que recebeu o privilégio só por causa da cor, e não por toda
historicidade passada. A conduta reacionária ignora a história e mantem o velho
discurso meritocrático.
O
pensamento neoliberal-conservador muito repete um velho dito popular: “não dou
o peixe, mas te ensino a pescar”. Fazendo uma breve analogia barata, o negro no
Brasil foi “ensinado a pescar, ou melhor, obteve permissão para a pesca, mas deixado sem vara, sem barco e a quilômetros
de um rio, enquanto os demais pescavam de molinete e de lancha. ” As cotas raciais
seriam como dar a “vara de pesca, o barco e levar ao rio, para que o negro
pudesse pescar”. Ou seja, dar as mesmas condições socioeconômicas através do
Direito, como ferramenta contra hegemônica emancipatória.
Gabriel
Magalhães Lopes
1º
ano de Direito – Noturno
Aula
2.1. Boaventura de Sousa Santos
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