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sábado, 7 de novembro de 2015

"Dar o peixe ou ensinar a pescar?"

Um assunto extremamente polêmico e em alta na sociedade brasileira é a questão das cotas raciais para o ingresso dos negros nas Universidades Públicas do Brasil. Muito se discute se essa ação afirmativa, com o intuito de promoção da igualdade de fato, é a melhor medida a ser comtemplada e se ela é justa, considerando o “privilégio” gerado por essa cota.
Grande destaque obteve o caso da reserva de 20% das vagas da UnB para os negros, sendo refutado pelo DEM, através de uma ADPF, descumprindo preceitos fundamentais da Constituição Federal e do ordenamento jurídico brasileiro, combatendo esse “privilégio” gerado por essa cota. Esse caso acabou por ser refutado, e é importante ressaltar o parecer do Ministro do STF Ricardo Lewandowski, rebatendo os argumentos da DEM em favor das cotas, ressaltando que a igualdade constitucional está apenas formalizada em lei e, na tentativa de atingir a igualdade de fato, é necessário criar meios de inclusão, como a cota racial e as ações afirmativas em geral, para se atingir a igualdade material.
Boaventura de Sousa Santos, ao analisar o direito como ferramenta de emancipação social ou não, demostra que para o Direito ser emancipatório, é necessário sair da concepção de Estado liberal e demo-socialista, sem ser levado pela agenda conservadora, bem confundida com o neoliberalismo. Para Boaventura, a emancipação social está atrelada a regulação social, o que gera a dialética regulada. Hoje, o livre comércio e a instabilidade do mercado geram a insegurança para o cidadão e enfraquece os sindicatos, fruto da reinvenção do modo de produção capitalista, o que gera a desregulamentação e consequentemente um entrave na emancipação social, o que prejudica a emancipação do negro, por exemplo.
É bem observável que o contrato social do cidadão com o Estado está em risco, debilitando o papel do Estado de segurança e bem-estar social dos indivíduos, deixando a população em um estado hobbesiano de competição e sobrevivência. Dentro deste quadro social, o que resta para os excluídos como para a maioria dos negros? Quais as chances de manutenção da vida dentro de um sistema em que se vive em um “estado civil incivil”?
Muitos irão dizer que a escravidão no Brasil já se encerrou, que eles já são livres e que possuem as mesmas condições de todos igualmente de se desenvolver com sucesso, e que, isso está constitucionalmente garantido para todos os brasileiros. Mas, é evidente que há um legado da escravidão, afinal, o negro ganhou a liberdade, mas que condições ele recebeu após a abolição? Que trabalho e de que modo eles eram tratados? Seriam vistos de uma hora para outra da mesma forma na sociedade? Passaram a desenvolver o comércio e possuírem meios de produção? Onde foram viver? Nos centros das cidades ou criaram as suas periferias?
Facilmente se observa que a maioria dos negros não estão inseridos socialmente, como Boaventura aponta, estes ainda passam pelo processo de exclusão, social e economicamente, gerando a instabilidade social para manutenção da estabilidade econômica do sistema capitalista, desse modo, eles se mantêm em um pré-contratualismo, tendo, por esses fatores, o acesso a cidadania impedido, tão almejada por qualquer um que possua a expectativa de ser cidadão, que mesmo após o fim da escravidão, não se consolidou em sua maior parte.
Outro ponto abordado por Boaventura é o fascismo social, este que controla a vida pública e conseguiu implantar juntamente com o conservadorismo o senso comum do povo brasileiro, o que também gera o apartheid social com a exclusão das subclasses, como os negros. Este fascismo social impõe uma verdade total, e uma vez que ela atinge o senso comum, tende a combater as “inverdades” que ameaçam o que é “certo”, como a “igualdade formal” da constituição em face à tentativa temporária de estabelecer a igualdade material através das cotas raciais, como forma de inclusão do negro na sociedade civil através do maior acesso a educação superior.
Assim, Boaventura destaca também o cosmopolitismo subalterno, uma forma de globalização contra hegemônica, concluindo que o Direito pode ser usado como emancipação social de forma a se evitar a exclusão de certos grupos minoritários.
 As cotas raciais não são eternas, mas sim medidas provisórias de emancipação social do negro enquanto grupo minoritário que muito contribuiu para o desenvolvimento econômico do Brasil com a escravatura, mas que, apesar de sua grande contribuição, através da exploração sofrida não recebe muito do que deveria da sociedade, muito pelo contrário, recebem uma enxurrada de discurso de ódio e racismo, sendo retratado como o “vagabundo” que recebeu o privilégio só por causa da cor, e não por toda historicidade passada. A conduta reacionária ignora a história e mantem o velho discurso meritocrático.
O pensamento neoliberal-conservador muito repete um velho dito popular: “não dou o peixe, mas te ensino a pescar”. Fazendo uma breve analogia barata, o negro no Brasil foi “ensinado a pescar, ou melhor, obteve permissão para a pesca, mas deixado sem vara, sem barco e a quilômetros de um rio, enquanto os demais pescavam de molinete e de lancha. ” As cotas raciais seriam como dar a “vara de pesca, o barco e levar ao rio, para que o negro pudesse pescar”. Ou seja, dar as mesmas condições socioeconômicas através do Direito, como ferramenta contra hegemônica emancipatória.
Gabriel Magalhães Lopes
1º ano de Direito – Noturno
Aula 2.1. Boaventura de Sousa Santos



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