Boaventura
de Sousa Santos, trata a questão “Poderá o direito ser emancipatório?” em seu
texto. Neste, o autor analisa a crise do direito decorrente da sociedade
capitalista em que há a emersão do fascismo social. Ao longo do
desenvolvimento, Boaventura aborda a questão da possibilidade de um novo
direito por meio da legalidade cosmopolita – “componente jurídica das lutas que
recusam aceitar o status quo do poder bem como o mal sistemático por ele gerado”
– e da globalização contra hegemônica as quais servirão aos movimentos,
projetos e lutas, que recebem o nome de cosmopolistismo subalterno, contra a
exclusão social, o fascismo social e globalização neoliberal decorrentes do capitalismo.
Especificamente
em uma parte de seu texto, Boaventura trata de quatro tipos de sociabilidade presentes nas zonas de contato – “campos sociais em que diferentes mundos da vida
normativos se encontram e defrontam”. São eles: violência (cultura dominante
suprime, marginaliza ou até destrói a cultura subalterna ou o mundo da vida
normativo), coexistência (permite-se que diferentes culturas evolucionem em
separado, mas com o desincentivo ou a proibição de contato ou hibridação das
culturas), reconciliação (baseada na justiça restauradora, no sanar de antigas
ofensas, deixando que os problemas do passado permaneçam no futuro) e convivialidade
(agravos do passado são revolvidos para não serem cometidos no futuro buscando
viabilizar sociabilidades alicerçadas em trocas tendencialmente iguais e na
autoridade partilhada). Os três primeiros tenderão a ser favorecidos por uma
constelação jurídica dominada pelo demoliberalismo e o último pelo
cosmopolitismo.
As
cotas raciais fazem parte de um modelo de ação afirmativa que visa à correção
de injustiças históricas provocadas pela escravidão na sociedade brasileira
encaixando-se, portanto, no tipo de sociabilidade da reconciliação. Além disso,
por ser favorecida por uma constelação jurídica dominada pelo demoliberalismo
não visa por completo a reparação do problema, ainda mais porque, se tratando
de uma ação afirmativa, não terá êxito completo se for aplicada sem
outras medidas em conjunto. Dessa forma, a cota caminha para ser um meio de
emancipação social e, em alguns casos têm êxito; no entanto, ela por si só
dificilmente trará a almejada emancipação social principalmente porque não está
em questão apenas a vaga na faculdade como também, por exemplo, o sustento do
estudante na cidade sede de seu curso, sua moradia, os gastos com material e
continuará sendo alvo de preconceito já que a cota é direcionada para os alvos
dele, necessitando de outra medida, como educação, direciona aos agentes do
preconceito.
Em
2009, o partido Democratas entrou na justiça com uma Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental argumentando que o sistema de cotas raciais da
Universidade de Brasília, o qual reserva 20% de todas as vagas disponíveis para
estudantes negros, é inconstitucional por ofender preceitos da Constituição
Federal como os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. O
plenário do Supremo Tribunal Federal negou o pedido considerando o sistema
constitucional e a Arguição improcedente.
Durante
as justificativas dadas pelo Democratas considerei algumas pertinentes – apesar de incapazes de justificarem o cancelamento das cotas – e outras totalmente sem
fundamento. Relacionadas aos pontos que considerei pertinente são os argumentos
como o da existência de um “Tribunal racial” para analisar se o candidato seria
merecedor da cota racial ou não, medida realmente constrangedora decorrente, por
exemplos, de questionamentos como o se o candidato já tinha namorado alguém de
cor negra; além disso, outro problema, que também concordo é o de ser impossível
estipular a cor de alguém. Por outro lado, achei totalmente sem fundamento
argumentos como “no Brasil, felizmente, conseguimos superar a vergonha da escravidão
sem termos desenvolvido o ódio entre as raças” e o fato de sempre usarem a cota
como medida atrelada unicamente à questão financeira. O primeiro argumento é
falho porque o preconceito racial é algo que claramente ainda está presente na
sociedade brasileira de moda que está distante de ter superado a vergonha da
escravidão. No segundo caso, as cotas não são apenas uma medida visando
solucionar o fato atrelado a questão financeira do negro, também estão
relacionadas ao fator do preconceito racial principalmente por estarem relacionadas.
Por
fim, enfatizo novamente a importância das cotas como meio de reparar problemas
passados e de servir como cosmopolitismo subalterno sendo tendenciosa a
emancipação social. No entanto, como é uma ação afirmativa de cunho de
reconciliação e aplicada por si só ainda não apresenta o completo potencial
para o fim dessa exclusão social.
Gabriela Mosna
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