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sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Mais uma vez o Estado de Direito, o arbítrio, o ativismo e questões atuais

     Dentre as premissas que tangem todos os Estados que se apresentam como democráticos, ainda que não o sejam, está o bem geral da população. Não há líder político que o negue. De pronto, sabe-se que a retórica em prol do bem-estar de um povo é ardil comumente usado para o desrespeito à lei. Assim, lembrando-se da Magna Carta de 1215, situação histórica antológica, faz-se possível perceber que naquele momento em que a Coroa inglesa tinha seus poderes delimitados, o que se arguia era que a discricionariedade real não poderia contrapor-se às liberdades e direitos, ainda que supostamente alegasse ter o rei “boas intenções”. Ora, é visível que, não raras vezes, o desrespeito aos ditames legais se justifica retoricamente dessa forma, aparentemente legitimando regimes de exceção, o fechamento de assembleias legislativas, além de golpes de Estado. Eis, pois, o âmago da questão que se propõe a analisar, a abrangência do papel do Poder Judiciário hodiernamente extrapolaria os limites legais? Pois, se se segue a teoria kelseniana de que o Poder Judiciário protege o ordenamento legal dos abusos dos outros poderes, quem protege o ordenamento legal dos abusos do Poder Judiciário?
     A ideia de legitimação que se imprime pela anuência dos magistrados a certas situações torna-se no ver de muitos incontestável. É nesse sentido que partem as análises acerca do ativismo judicial, dado refletir-se: se a função primária dos juízes é que sejam passivos cumpridores da lei, é questionável o porquê de, atualmente, multiplicarem-se as interpretações diversas de uma mesma lei e a mudança recorrente de posições do Judiciário quanto a fatos definitivamente idênticos. O caso perpetrado pelo STF- no julgamento da constitucionalidade da execução de pena a partir de decisão de segunda instância- é notório exemplo. O entendimento da Corte Suprema foi alterado mais de uma vez em menos de uma década e o julgamento dessa pauta ainda voltará a ser discutido; ao que parece no senso comum, a letra da lei se descarta conforme as opiniões pessoais dos julgadores. Chega a ser admirável o grau de controvérsia gerado sobre o inciso LVII, do artigo 5º da Constituição Federal (ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória).  Um dos elementos que demonstra o caso do ativismo judicial está no fato de que, dos ministros que julgaram a referida questão, houve quem se utilizasse de argumentos metajurídicos para justificar seus entendimentos de constitucionalidade. 
     Noções relativas à competência de poderes são cruciais nessa discussão. E sob essa perspectiva Roberto Barroso atribui legitimidade a situações em que o Judiciário não age de forma simplesmente passiva: “Na medida em que lhes cabe atribuir (os juízes) sentido a expressões vagas, fluidas e indeterminadas, como dignidade da pessoa humana, direito de privacidade ou boa-fé objetiva, tornam-se, em muitas situações, co-participantes do processo de criação do Direito.” É factual e conclusivo que se considere tal hipótese, como disse o próprio autor, como sendo uma “cura”, mas ele mesmo lembra “Em dose excessiva, há risco de se morrer da cura.”
      Esse é o entendimento que se acaba por concluir, tendo em vista a presente ordem jurídica prestigiadora do Judiciário como protetor da Constituição, fato citado também por Barroso se lembrando do combate teórico de Hans Kelsen e Carl Schmitt. Uma delimitação maior de tais noções de papéis e competências dentro do Estado de Direito se dá pelas noções de Ingeborg Maus. A autora ao criticar o Tribunal Constitucional Alemão ressalta entendimentos deste tribunal que chegou a se manifestar, invocando para seus julgamentos, princípios suprapositivos transcendentes à constituição. Aí está, pois, o percalço do ativismo, a lei poderia não mais ser pressuposto basilar nas ações jurisdicionais. Por ora, as conclusões a que se chega tendem a corroborar que se as demandas pela judicialização da vida crescem, ainda há lacunas do Direito não preenchidas ou, se preenchidas estão, falta-lhes cumprimento.

Gustavo de Oliveira- 1º ano noturno


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