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sábado, 16 de outubro de 2021

Terceirização da voz

    Pierre Bourdieu, ilustre sociólogo francês, denominou o um fenômeno pelo nome de HabitusSendo este o conjunto de ideias, opiniões e modos das pessoas que são moldados pela vivência e educação de cada um. Seu conceito vem à mente com uma leitura das requisições dos amici curiae na ADPF 324, que questionava a legalidade ou não da terceirização do trabalho e de decisões jurisprudenciais sobre o tema. 

    A primeira foi feita CEBRASSE – CENTRAL BRASILEIRA DO SETOR DE SERVIÇOS, uma associação nacional dos empresários do terceiro setor, endossada também por outras associações e sindicatos patronais. A segunda é feita pela ANAMATRA - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO.  

    Curiosamente se encontra, assim como nas mais variadas esferas da vida humana, duas posições distintas e opostas de pessoas de vivência extremamente similar. Nos afastemos momentaneamente os aspectos jurídicos de ambas requisições para um enfoque maior na visão do autor. Na primeira, a CEBRASSE, argumenta em favor da terceirização pelos aspectos favoráveis a produtividade e inerentes a ela e nega que ela seja causa inerente de precarização do trabalho, e que esta precarização deve ser combatida em si e não por meio da proibição da terceirização. A segunda, da ANAMATRA, é argumentada uma posição favorável a proibição (ou reconhecimento de uma proibição anterior) do trabalho terceirizado como um todo, porém admitindo-o com ressalvas para atividades meio. 

    O fato é: Tanto os empresários, os advogados que intermediaram e os juízes da associação são a nata de salários do país. E também em seu passado se constituem desta maneira, visto que ambas requisições datam de 2011, onde sequer a chance de sua ascensão ter se dado por meio de um diploma de uma "uniesquina" somado a muito trabalho havia. Não seria de maneira alguma estranho que alguns deles até tenham sido colegas nos mesmos colégios caríssimos, frequentado os mesmos clubes de esportes, as mesmas baladinhas etc... 

    Similares casos também podem ser notados na vida diária de qualquer pessoa. Não é raro o caso de filhos de alcoólatras que se dividem entre os que nunca beberam por que não quiseram ser igual os pais e os que bebem porque também seus pais bebiam. Ainda que tivessem a mesma bagagem cultural, educacional e social eles tiveram esta dissonância neste aspecto fundamental da vida. Como isto poderia ser? Bourdieu se esforça para não ter uma visão afunilada da sociedade, vendo-a mais como uma omelete do que gema e claras.  

    De maneira que ele reconhece inúmeros tipos de capital que uma pessoa pode ganhar ao longo da vida que não necessariamente são financeiros. No caso de nossa análise; os empresários podem ter adquirido em suas práticas profissionais um tipo diferente de capital cultural e social voltado ao aumento e consolidação da produção de riquezas, visto que seu dinheiro depende dela. E os juízes, ao longo de suas carreiras podem ter adquirido capitais socioculturais orientados a preservação de direitos independentemente dos efeitos econômicos, visto que seu salário é fixo e independe do sucesso ou desgraça econômica que suas decisões causam.  

    Portanto a visão do autor se mostra bastante flexível e orientada para a apreensão da realidade completa e não por meio de chavões e pensamentos prontos. 


Rafael C. M. Martinelli 2o sem/noturno

 

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