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sábado, 16 de outubro de 2021

A independência relativa da decisão do Ministro Dias Toffoli.

    O sociólogo francês Pierre Bourdieu destoa dos demais estudiosos da área ao propor uma sociologia com a função de fornecer mecanismos teóricos para que ocorra a transformação social e, simultaneamente, desvelar a realidade. Diferentemente da visão superficial que as lutas são engendradas unicamente por diferenças econômicas, o autor aprofunda a discussão ao relacionar a posição de privilégios com a socialização do indivíduo e o acesso aos bens simbólicos. Dessa maneira, Bourdieu depreende que as relações têm como elemento permanente a dinâmica concorrencial em decorrência da hierarquização de classes existente no mundo capitalista a qual é sustentada pela desigualdade material e simbólica.

     Nessa perspectiva, Bourdieu elabora conceitos para melhor compreender como se dão as disputas entre os grupos, sendo eles o habitus (sistema de percepções e ações que influenciam as escolhas do indivíduo e é incorporado devido à condição de classe), capital (os recursos materiais e simbólicos acumulados durante a trajetória da vida) e o campo (espaço pelo qual é revelado o habitus e o acúmulo de capitais, os quais juntos demonstram a posição de privilégio ou não-privilégio do grupo ou sujeito). Portanto, as pessoas que concentram diferentes capitais tendem a ocupar a posição de dominância em diversos campos e, consequentemente, desenvolvem o habitus a ser seguido.

   Devido à relação mútua de construção do Direito e da sociedade, o campo jurídico também é permeado por lutas concorrenciais em que os agentes se valem de expressões de racionalidade, como o jargão e a hermenêutica, para validar sua argumentação, entretanto, para Bourdieu, esta é relativamente influenciada por aspectos externos. Com isso, o jurídico se transveste do ideal de neutralidade e autonomia, mas na realidade está intimamente atrelado à posição social do agente, afastando-se das normas puras do Direito.

     À vista disso, a decisão do Ministro Dias Toffoli a favor da suspensão da liminar 1.248 pode ser analisada à luz do pensamento bourdieusiano, uma vez que o veredicto é vinculado às atitudes éticas dos agentes. Para entender melhor o posicionamento do Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), deve-se ter em mente sua condição social: filho de cafeicultores de renda média e descendente de italianos, Toffoli teve o privilégio de cursar Direito na Universidade de São Paulo (USP). Além disso, sua trajetória na área política esteve relacionada ao Partido dos Trabalhadores (PT) que é reconhecido como um partido com viés social.

   Posto isto, os fatores supracitados influenciaram no julgamento do Ministro, visto que sua experiência em uma universidade pública que defendeu, durante a ditadura militar, a liberdade e o contato com o partido considerado — erroneamente — de esquerda, colaborou para que durante sua argumentação fosse evocado diversas vezes o princípio de igualdade e não discriminação com o grupo lgbtqia+; assim como a defesa da liberdade de expressão na Bienal do Livro. Deste modo, a maneira como cada magistrado utiliza as fontes do Direito, para embasar seus argumentos, está relacionada à socialização do indivíduo no seio familiar e escolar.


Referências:
SCHREIBER, Mariana - Quem é Dias Tofolli, o polêmico ministro que vai assumir o comando do STF - BBC News Brasil - Brasília - 10/09/2018 / Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-45470409 / Acesso: 15/10/2021

DOSSIÊ PIERRE BOURDIEU - In: Revista Cult, Edição 128, mar/2010, p. 44 - 64

Bruna Soares Teixeira - Direito Noturno

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