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sábado, 3 de julho de 2021

 

Conhecer é mais perfeito do que duvidar?

   Na infância, tudo é novidade na vida das pessoas. O mundo é uma grande experiência de descoberta e é comum a postura curiosa perante a natureza. “Por que o céu é azul?” “Porque o Sol brilha?” “Porque camaleões mudam de cor?” e outras muitas perguntas do gênero são frequentes na infância. Contudo, à medida que envelhecemos, essa visão investigativa do mundo geralmente se dilui e passamos a absorver informações de forma passiva e até mesmo desinteressada. Constatada essa mudança de mentalidade, faz-se relevante uma análise, com um viés filosófico, sobre os perigos velados desse fenômeno que se apresenta de forma tão natural na vida humana.

   Em uma primeira perspectiva, tal postura acrítica e irreflexiva não é tão inofensiva quanto pode parecer de início, pois além de favorecer a dominação intelectual das pessoas, está relacionada a uma cultura nociva que percebe o “conhecer” como mais nobre do que o “duvidar” ou o “questionar” e que leva os indivíduos – seja por vergonha ou prepotência – à presunção do conhecimento. Esse cenário é preocupante porque constitui um dos pilares psicológicos das “fake news”, tão disseminadas atualmente, em especial nas mídias digitais. Ademais, não é adequado ao profissional do século XXI essa comodidade em relação à aprendizagem. Depois do advento da Terceira Revolução Industrial, o profissional valorizado não é somente aquele que tem o conhecimento ou boas ideias prontas (pois essas agora são frequentemente oferecidas por computadores ou por algoritmo) mas o indivíduo em constante aprendizado e que sabe fazer boas perguntas, e, para isso, é necessária a genuína curiosidade.

   Sob uma ótica diferente, também é possível traçar um paralelo interessante entre essa questão do conhecimento na sociedade contemporânea e filósofos até hoje lembrados quando o objeto de estudo é o próprio conhecimento. René Descartes, por exemplo, em “O Discurso do Método”, constrói um raciocínio baseado na ideia de que conhecer é mais perfeito do que duvidar e constata sua evidente imperfeição, já que sua mente estava repleta de dúvidas acerca da realidade. Ademais, apesar de ter chegado a uma conclusão, se posiciona coerentemente com o princípio básico de refutabilidade da Ciência, e, antes mesmo de começar a exposição de suas divagações, equipara a sua obra a uma fábula, no sentido de que não tem a pretensão de elucidar respostas definitivas (se é que essas existem). A postura do filósofo de valorização do aperfeiçoamento do espírito em detrimento da posse do conhecimento absoluto é, mais do que nunca, um atributo positivo. Já Francis Bacon, tem uma contribuição diferente, pois identifica os Ídolos, empecilhos para a obtenção do conhecimento, e por meio dessa observação infere a dificuldade do processo de conhecimento. Tal lição é muito válida no contexto atual, no qual muitas pessoas, imbuídas em sua própria comodidade, nem sequer concebem o conhecimento como um processo, mas como um conjunto de informações avulsas, não raro, adquiridas por veículos não confiáveis.

   Por fim, é possível apreender que a postura investigativa infantil, exatamente por se assemelhar a de um cientista, é mais necessária do que nunca, em tempos tomados pela desinformação quase generalizada.  Sua importância está não somente na necessidade de se adequar ao mercado do futuro, mas fundamentalmente no exercício pleno da cidadania. Assim, tem-se que conhecer é mais perfeito do que duvidar, mas duvidar sempre será mais perfeito do que presumir conhecer. 

Isabela Mansi Damiski Teixeira de Castro - Primeiro ano Diurno


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