"- Estou preocupada com Amélie porque gosto de você.
- O que quer dizer?
- Em geral os homens de quem eu gosto são mentalmente instáveis. Eu gostaria de saber mais sobre você.
- Pode perguntar.
- Uma andorinha só não faz...
- Uma andorinha..? Verão.
- A prática faz...
- A perfeição.
- A curiosidade...
- Matou o gato.
- Pela boca...
- Morreu o peixe.
- Pedra que rola...
- Não cria limo.
- Antes tarde...
- Do que nunca.
- O que os olhos não vêem...
- O coração não sente.
- Nada mal.
- Você os coleciona?
- Em casa, dizemos que um homem que sabe provérbios não é de todo ruim. "
Esse diálogo entre Gina e Nino, amiga e par romântico da personagem Amélie, do filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain sempre me intrigou. Somente após ler Durkheim e sua definição do fato social foi que pude finalmente entender como uma coisa tão banal e aparentemente uma simples brincadeira - que é colecionar provérbios – pode definir uma pessoa.
Para o pensador, também francês, a individualidade ocorre apenas na "constituição orgânico-psíquica do individuo", em sua consciência (citando outro filme, Submarine, "No-one can truly know what anyone thinks or feels"). Porém, essa consciência complexa e indecifrável pouco importa, porque nosso comportamento é externo a nós mesmos, incorporado pela osmose coercitiva que é característica do fato social. Ser, ou não ser não é mais a questão. Somos e somos repetidamente. Um caleidoscópio de papéis sociais: nada mais a pensar, nada mais a inventar. Só sentir, sentir tudo de novo como tudo novo.
Os fatos sociais são previstos e imperativos por leis, regras sociais, um ethos, um padrão: as normas jurídicas, a religião, o bom costume, a classe social, a tradição, os provérbios... Contrariar essas leis gera uma punição externa, seja uma sanção jurídica, seja uma exclusão social do infrator, e também, uma autopunição, essa que acontece na nebulosidade do psíquico e enchem as clínicas dos psicólogos. Para mim, essa necessidade interna de obedecer às regras vem do desespero humano de sentir que pertence a algo. Talvez resultado do conhecimento que homem tem de sua própria morte (outro provérbio, na vida só temos uma certeza...) que o faz querer pertencer a algo mais duradouro, algo objetivo, palpável, fora de seus pensamentos e sentimentos, que possa ser estudado e registrado. Talvez simplesmente para não viver em sua concepção de realidade sozinho.
Gina acredita no poder dos provérbios como lei social. E eu também.
Nenhum comentário:
Postar um comentário