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sábado, 9 de junho de 2018

Luta simbólica: descriminalização ou não do aborto de anencélafos


A interessante discussão acerca dos limites do direito individual de uma pessoa ganhou repercussão e entrou em pauta em muitos debates jurídicos depois que no ano de 2004, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde entrou com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no que tange a criminalização do aborto de anencéfalos, pois a lei presente no código penal brasileiro coloca em risco os direitos fundamentais da mãe. A priori deve-se entender quais são as condições físicas e psíquicas de um anencéfao: a anencefalia configura-se por uma má formação do tubo neural no feto logo nas primeiras da gravidez, e como consequência dessa má formação o recém-nascido anencéfalo pode nascer sem os principais sentidos como a audição, visão; ou até mesmo inconsciente, sem a possibilidade de sentir dor ou reagir a toques, por exemplo. Vale ressaltar que, grande parte das gestações nessas situações não chegam ao final. Para o médico e professor de ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí, Thomaz Gollop a interrupção da gestação de um feto com anencefalia não pode ser considerada um aborto, já que não há perspectiva de uma vida extrauterina do bebê. O que de fato acontece nesses casos pode ser considerado apenas uma antecipação do parto, isenta de criminalização.
Mediante a criminalização do aborto de anencéfalos, o Estado obriga a mulher a manter uma gestação sem perspectiva de futuro, o que afeta negativamente o psicológico da mesma e instrumentaliza seu corpo sem dar a ela a possibilidade de escolha.
No momento em que a questão começa a ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a comoção da população majoritariamente religiosa no território nacional foi expressivamente contra o aborto mesmo diante dessas condições delicadas. E apesar da opinião popular ser pertinente em determinados assuntos, é um ato perigoso deixar que o direito se molde segundo as pressões populares, o que Bourdieu chamou em sua obra de instrumentalismo, no que tange o aborto de anencéfalos, permitir que a população guiada por um extinto religioso interfira na decisão, seria imprudente para com os direitos fundamentais da mulher. É importante lembrar que mesmo que nesse caso o direito não pudesse agradar a opinião da maioria, o formalismo (visão do direito como algo inerente à pressão popular) também deve ser evitado.
Segundo Bourdieu a luta simbólica entre os doutrinadores (encarregados da elaboração teórica) e os operadores (associados aos trabalhos dos magistrados, que realizam atos de jurisprudência e contribuem para a construção jurídica) está representada metaforicamente pela dualidade de opiniões dos ministros responsáveis pelo caso exposto. Os doutrinadores representam aqueles que almejam seguir rigidamente o código penal e o que nele está juridicamente previsto a respeito da criminalização do aborto, alegando que a esfera judiciária não tem competência para ir de encontro com uma lei legalmente vigente. Por outro lado, temos os operadores do direito, que alegam a impossibilidade de se seguir leis retrogradas em certos aspectos, e que através da jurisprudência modelam o direito ao contexto social atual, encontrando no próprio código penal falhas para justificar a descriminalização do aborto de anencéfalos. A disputa pelo direito de dizer o direito foi vencida nesse caso pelos operadores. Destarte, em 2012 foi decidido a favor de descriminalização do aborto de anencéfalo

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