Um dos
sociólogos com maior projeção internacional, o português, Boaventura de Sousa
Santos, desenvolveu uma obra intitulada “Para uma revolução democrática da
justiça”, na qual demonstra suas preocupações para com o panorama hodierno que
o Direito se encontra. Nesse sentido, uma das questões de maior trabalho
teórico do professor, foi o acesso à justiça. Isso porque, ele verificou a
tendência do Direito de apenas resolução dogmática de litígios, extraindo as
questões sociais que permeiam o âmbito jurídico, tal qual a inclusão da
população carente nesse meio.
Assim, faz-se extremamente necessário a percepção de que dar
voz para as populações em situações precárias de direitos deveria ser o maior
objetivo da justiça, atualmente. Para isso, esses grupos, caracterizados pela
falta de representatividade jurídica (Mulheres, negros, pessoas carentes
financeiramente, homossexuais, indígenas, entre outros) devem ser assistidos
pelo sistema judicial em situações de necessidade, uma vez que a todo momento
estão sujeitos a discriminações e preconceitos, logo, veem-se à margem da
sociedade por não terem conhecimento de seus direitos e por não conseguirem
utilizá-los de forma coerente com o ordenamento jurídico e a realidade
concreta.
Nessa perspectiva, o Voto-vista de Barroso STF (Supremo
Tribunal Federal), acerca da interrupção da gravidez no 1° trimestre de
gestação, mostra-se notoriamente relevante, uma vez que a principal temática
tratada é a integridade física e psíquica da gestante e os efeitos
discriminatórios sofridos por elas. Visto que o ideal de igualdade e liberdade,
que deveriam ser assegurados pelo artigo 5° da Constituição Federal Brasileira
de 1988 não passam de simples positivações quando o assunto é o modo de vida
das mulheres, cujas reivindicações não são devidamente atendidas, pois a
dogmática imposta a suas demandas é extremamente machista, uma vez que as
jurisprudências anteriores sempre foram de privilégios masculinos. Portanto,
uma mudança hermenêutica na justiça é imprescindível para que ela se torne
democrática, além de melhoria no acesso ao conhecimento de direitos e deveres
que cada cidadão deveria possuir, mas não consegue exercê-los, por não
encontrar instrumentos para tal.
Dessa forma, Boaventura analisa uma série de meios para
conseguir tal acesso, destacando: As defensorias públicas, promotoras legais
populares, as acessórias jurídicas universitárias populares, a capacitação
jurídica de líderes comunitários e advocacias populares. Dentre esses meios, a
atuação no campo do feminismo realizada pelas promotoras legais populares é
digna de respeito, uma vez que capacitam mulheres de seus direitos humanos e
fundamentais, assim como o seminário promovido pelo CLADEM (Comitê
Latino-americano de defesa dos direitos das mulheres) em 1992, no qual vários
países que já desenvolviam essa instituição, que posteriormente foi adotada no
território brasileiro.
Esses direitos transmitidos são de extrema utilidade no
embasamento teórico para as discussões como a do aborto no 1° trimestre de
gravidez, como exposto por Barroso, no qual as mulheres de baixa renda e de
pouco conhecimento jurídico são submetidas desigualdade de gênero e falta de
respeito para com sua integridade física, pois os homens apropriam-se de seus
privilégios para impor sua dominação sobre as mulheres, oprimindo-as a não
terem liberdade de escolha para decidirem sobre sua própria condição de vida.
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