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domingo, 5 de dezembro de 2021

Justiça e liberdade

 

            Um dos sociólogos com maior projeção internacional, o português, Boaventura de Sousa Santos, desenvolveu uma obra intitulada “Para uma revolução democrática da justiça”, na qual demonstra suas preocupações para com o panorama hodierno que o Direito se encontra. Nesse sentido, uma das questões de maior trabalho teórico do professor, foi o acesso à justiça. Isso porque, ele verificou a tendência do Direito de apenas resolução dogmática de litígios, extraindo as questões sociais que permeiam o âmbito jurídico, tal qual a inclusão da população carente nesse meio.

    Assim, faz-se extremamente necessário a percepção de que dar voz para as populações em situações precárias de direitos deveria ser o maior objetivo da justiça, atualmente. Para isso, esses grupos, caracterizados pela falta de representatividade jurídica (Mulheres, negros, pessoas carentes financeiramente, homossexuais, indígenas, entre outros) devem ser assistidos pelo sistema judicial em situações de necessidade, uma vez que a todo momento estão sujeitos a discriminações e preconceitos, logo, veem-se à margem da sociedade por não terem conhecimento de seus direitos e por não conseguirem utilizá-los de forma coerente com o ordenamento jurídico e a realidade concreta.

    Nessa perspectiva, o Voto-vista de Barroso STF (Supremo Tribunal Federal), acerca da interrupção da gravidez no 1° trimestre de gestação, mostra-se notoriamente relevante, uma vez que a principal temática tratada é a integridade física e psíquica da gestante e os efeitos discriminatórios sofridos por elas. Visto que o ideal de igualdade e liberdade, que deveriam ser assegurados pelo artigo 5° da Constituição Federal Brasileira de 1988 não passam de simples positivações quando o assunto é o modo de vida das mulheres, cujas reivindicações não são devidamente atendidas, pois a dogmática imposta a suas demandas é extremamente machista, uma vez que as jurisprudências anteriores sempre foram de privilégios masculinos. Portanto, uma mudança hermenêutica na justiça é imprescindível para que ela se torne democrática, além de melhoria no acesso ao conhecimento de direitos e deveres que cada cidadão deveria possuir, mas não consegue exercê-los, por não encontrar instrumentos para tal.

    Dessa forma, Boaventura analisa uma série de meios para conseguir tal acesso, destacando: As defensorias públicas, promotoras legais populares, as acessórias jurídicas universitárias populares, a capacitação jurídica de líderes comunitários e advocacias populares. Dentre esses meios, a atuação no campo do feminismo realizada pelas promotoras legais populares é digna de respeito, uma vez que capacitam mulheres de seus direitos humanos e fundamentais, assim como o seminário promovido pelo CLADEM (Comitê Latino-americano de defesa dos direitos das mulheres) em 1992, no qual vários países que já desenvolviam essa instituição, que posteriormente foi adotada no território brasileiro.

    Esses direitos transmitidos são de extrema utilidade no embasamento teórico para as discussões como a do aborto no 1° trimestre de gravidez, como exposto por Barroso, no qual as mulheres de baixa renda e de pouco conhecimento jurídico são submetidas desigualdade de gênero e falta de respeito para com sua integridade física, pois os homens apropriam-se de seus privilégios para impor sua dominação sobre as mulheres, oprimindo-as a não terem liberdade de escolha para decidirem sobre sua própria condição de vida.

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