Com o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito, os direitos fundamentais são, por demasiadas vezes, assegurados pela constituição federal. Entretanto, a realidade prática pode divergir dessas definições teóricas por meio da utilização do direito como instrumento que somente replica o que está escrito nas codificações, negando as realidades sociais. Sendo assim, percebe-se a relevância da atuação dos juristas ora a conservar as condutas já estabelecidas, ora a modificar a estrutura social.
Seguindo essa lógica, Boaventura de Sousa Santos em sua obra, "Para uma revolução democrática da justiça" argumenta sobre o modo através do qual o sistema de justiça foi criado como instrumento de continuidade e não de ruptura. A saber que o autor defende o pensamento da aplicação do direito seguindo uma concepção burocrática ou administrativa dos processos. Por conseguinte, os profissionais dessa área do conhecimento expressam um caráter hermético, isto é, apresentam uma atuação profissional restrita ao ambiente jurídico sem o maior comprometimento com os problemas sociais.
Pensando nisso, a questão da descriminalização do aborto, no Brasil, evidencia esse conflito entre a pura aplicação das normas jurídicas e a realidade social, uma vez que o crime de aborto está previsto pelo artigo 126 do Código Penal brasileiro. Todavia, a efetiva prática desta medida ignora as consequências na vida da mulher, a qual não deseja prosseguir na condição de ser mãe, limitando o exercício pleno de seus direitos fundamentais como, por exemplo, a autonomia do gênero feminino, sua integridade física e, até mesmo, psíquica da gestante. Dessa forma, como é apresentado no voto-vista do ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, a criminalização do aborto é uma questão de saúde pública, atingindo, principalmente, as mulheres de baixa renda, as quais sem possuir os devidos recursos financeiros buscam auxílio em instalações clandestinas para a realização deste fim.
Em suma, deve haver uma transformação no ensino do direito, a fim de expandir a interpretação dos juristas não somente à aplicação das normas legais, mas também à análise de sua atuação perante aos empecilhos sociais, promovendo uma situação de maior igualdade entre os cidadãos.
Bruno Solon Viana - Direito Matutino
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