Total de visualizações de página (desde out/2009)

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

A legalidade da expedição de ordem de desapropriação da comunidade de Pinherinho



A desocupação de Pinheiro foi uma das mais polêmicas dos últimos anos, gerando discussões sobre a legitimidade e legalidade da operação. Forças policiais adentraram em um domingo de manhã para desocupar a área, ouve resistência dos moradores e confrontos. Após o término surgiram denuncias envolvendo agressões físicas, assassinatos, violência sexual, restrição de locomoção, entre outras.
Uma das questões mais debatidas foi a ação dos magistrados que julgaram a questão e essa análise será feita no presente texto, utilizando ferramentas fornecidas pelo direito e por diferentes pensadores.
Friedrich Hegel acredita que o Estado só têm condições de cumprir seus deveres quando se baseia na racionalidade e é autônomo, podemos interpretar essa afirmação como a resistência às pressões exógenas e endógenas. Focando no que for melhor para o coletivo e não a um grupo específico.
Apesar do considerável número de famílias vivendo naquele terreno, eles não deixam de ser um grupo social com interesses e perspectivas próprias. E a lei sendo um acordo racional aceito pela sociedade deve ser respeitada e soberana, pois somente dessa forma os direitos de todos, e não de um grupo, serão respeitados.
Dessa forma conclui-se que seguir as normas estabelecidas é o caminho para evitar injustiças, já que os direitos e as obrigações são iguais para todos, então não existem impedimentos legais que alguém adquira uma propriedade.  
Essa visão é fortemente questionada por Karl Marx e pensadores marxistas. O direito é um mecanismo de coerção da minoria dominante sobre a maioria oprimida. Nesse caso uma burguesia, que ascendeu politicamente após as revoluções liberais, deseja manter sua autoridade e privilégios e para esse fim possui tem a sua disposição o Estado liberal, englobando o judiciário. A relação oprimido/opressor é construida através uma série de relações econômicas que moldam a sociedade.
A população oprimida encontrou na forma de ocupações uma resistência ao atual sistema econômico (luta de classes) que a exclui e impede acesso ao capital, entre eles a propriedade privada (que apesar de já existir tornou-se uma forma de capital após as revoluções liberais).
Todavia, Marx Weber discorda de Marx, para ele a concepção marxista se foca excessivamente no econômico, ignorando outros fatores que moldaram a atual sociedade. Apesar da luta de classes poder existir, ela não levaria a um confronto direto e ao fim do modo de produção capitalista, não explicando completamente os eventos ocorridos em Pinheirinho.
Até o momento tratamos do direito e de seus fundamentos, mas agora passaremos a especificar, trazendo elementos da legislação brasileira.
Uma das principais alegações, dos defensores que a população permanecesse em Pinheirinho, era de que a área pertenceria ao especulador Naji Nahas. Devido ao seu enriquecimento ilícito e o fato do terreno está improdutivo e inabitado, não cumprindo sua função social, seria justo que fosse destinado a reformas sociais.
Entretanto se Naji Nahas possui pendências criminais ele não perde seus direitos fundamentais (estabelecidos pelo artigo 5º da Constituição), entre eles o direito de possuir propriedade privada, podendo manter suas posses materiais.
É mais correto afirmar que o terreno pertence à massa falida SELECTA S/A, então a prioridade de receber os benefícios do terreno são os credores, sendo o principal o município de São José dos Campos. E somente com os débitos quitados poderia destinar o terreno a outro fim (como o habitacional).
Além de que não é responsabilidade da SELECTA S/A ou de Naji Nahas garantir o direito a moradia, essa é uma função do Estado brasileiro, essa afirmação é realçada pelo Ministério Público Federal, que em 2005, entrou com uma ação contra a prefeitura de São José dos Campos por omissão em relação ao déficit de moradias.
O terreno realmente descumpria sua função social, mas como dito anteriormente ele não poderia ser desapropriado até saldarem os débitos. E caso fosse desapropriado o artigo 5º da Constituição Federal estabelece o pagamento de indenização ao proprietário e seria necessário averiguar se a prefeitura de São José dos Campos ou os governos estadual ou federal teria condições de arcar com o valor de meio bilhão de reais, o que provavelmente não seria possível.
E para evitar abusos e o comprimento da lei a desapropriação deve ser feita pelas autoridades competentes e não através de esbulhos.
Outra acusação aos magistrados é que eles se isentam de culpa dos ocorridos em Pinheirinho e de acordo com o Código de Ética da Magistratura, os que julgam são responsáveis por sua decisão. Porém não era possível ter ciência de todos os eventos que aconteceriam e teve a preocupação de que após a retirada os moradores não ficassem desamparados, já que na ordem pede que a prefeitura fosse oficiada sobre a desapropriação. E ela posteriormente cadastrou os habitantes para receber o “aluguel social” e o “auxílio mudança”.
Também se questiona a proibição da defensoria pública intervir no caso, todavia, esse órgão não pode se envolver em questões de direito privado, como era o caso e os habitantes já eram representados por advogados contratados pela associação de moradores.
Vale ressaltar também que os representantes legais da comunidade de Pinheirinho não fizeram tudo o que estava ao seu alcance para garantir a posse da propriedade aos ocupantes.  Existem três tipos de usucapião, sendo o mais comum o pedido que exige 15 (quinze) anos de uso e a não interferência do proprietário, mas o artigo 10 do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) prevê a usucapião coletiva que tem como requisito a ocupação por 5 (cinco) anos ininterruptos e sem oposição de áreas urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados por população de baixa renda com o fim de constituir moradia, com a ressalva de que os possuidores não sejam proprietários de qualquer outro imóvel. Requisitos que os moradores de Pinheirinho se enquadravam por não ocuparem todo o terreno e a entrada com esse pedido não foi realizada.
A desocupação da comunidade de Pinheirinho continua a ser debatida, com a ocorrência de violações dos direitos humanos pelas forças policiais, mas ordem para a desocupação respeita os princípios do direito por garantir a igualdade perante a lei. Essa visão é questionada principalmente pelos marxistas, que por sua vez são questionados por weberianos que consideram que métodos marxistas não abrangem toda a realidade. Considerando o direito brasileiro a ordem de desocupação foi legal já que manteve a posse de uma propriedade que seria destinada a quitação de dívidas. Concluindo que o principal problema de Pinheirinho não foi à ordem expedida e sim sua aplicação.  

João Pedro Costa Moreira - 1º Ano Direito Noturno

Nenhum comentário:

Postar um comentário