A desocupação de
Pinheiro foi uma das mais polêmicas dos últimos anos, gerando discussões sobre
a legitimidade e legalidade da operação. Forças policiais adentraram em um
domingo de manhã para desocupar a área, ouve resistência dos moradores e
confrontos. Após o término surgiram denuncias envolvendo agressões físicas,
assassinatos, violência sexual, restrição de locomoção, entre outras.
Uma das questões mais
debatidas foi a ação dos magistrados que julgaram a questão e essa análise será
feita no presente texto, utilizando ferramentas fornecidas pelo direito e por
diferentes pensadores.
Friedrich Hegel acredita que o Estado só têm
condições de cumprir seus deveres quando se baseia na racionalidade e é
autônomo, podemos interpretar essa afirmação como a resistência às pressões exógenas e endógenas. Focando no que for melhor para o coletivo e não a um
grupo específico.
Apesar do considerável número de famílias vivendo
naquele terreno, eles não deixam de ser um grupo social com interesses e perspectivas próprias. E a lei sendo um acordo racional aceito pela sociedade
deve ser respeitada e soberana, pois somente dessa forma os direitos de todos, e
não de um grupo, serão respeitados.
Dessa forma conclui-se que seguir as normas
estabelecidas é o caminho para evitar injustiças, já que os direitos e as
obrigações são iguais para todos, então não existem impedimentos legais que
alguém adquira uma propriedade.
Essa visão é fortemente questionada por Karl Marx e
pensadores marxistas. O direito é um mecanismo de coerção da minoria dominante
sobre a maioria oprimida. Nesse caso uma burguesia, que ascendeu politicamente
após as revoluções liberais, deseja manter sua autoridade e privilégios e para
esse fim possui tem a sua disposição o Estado liberal, englobando o judiciário.
A relação oprimido/opressor é construida através uma série de relações
econômicas que moldam a sociedade.
A população oprimida encontrou na forma de ocupações
uma resistência ao atual sistema econômico (luta de classes) que a exclui e
impede acesso ao capital, entre eles a propriedade privada (que apesar de já
existir tornou-se uma forma de capital após as revoluções liberais).
Todavia, Marx Weber discorda de Marx, para ele a
concepção marxista se foca excessivamente no econômico, ignorando outros
fatores que moldaram a atual sociedade. Apesar da luta de classes poder
existir, ela não levaria a um confronto direto e ao fim do modo de produção
capitalista, não explicando completamente os eventos ocorridos em Pinheirinho.
Até o momento tratamos do direito e de seus fundamentos,
mas agora passaremos a especificar, trazendo elementos da legislação
brasileira.
Uma das principais alegações, dos defensores que a
população permanecesse em Pinheirinho, era de que a área pertenceria ao
especulador Naji Nahas. Devido ao seu enriquecimento ilícito e o fato do
terreno está improdutivo e inabitado, não cumprindo sua função social, seria
justo que fosse destinado a reformas sociais.
Entretanto se Naji Nahas possui pendências criminais
ele não perde seus direitos fundamentais (estabelecidos pelo artigo 5º da
Constituição), entre eles o direito de possuir propriedade privada, podendo
manter suas posses materiais.
É mais correto afirmar que o terreno pertence à
massa falida SELECTA S/A, então a prioridade de receber os benefícios do
terreno são os credores, sendo o principal o município de São José dos Campos.
E somente com os débitos quitados poderia destinar o terreno a outro fim (como
o habitacional).
Além de que não é responsabilidade da SELECTA S/A ou
de Naji Nahas garantir o direito a moradia, essa é uma função do Estado
brasileiro, essa afirmação é realçada pelo Ministério Público Federal, que em
2005, entrou com uma ação contra a prefeitura de São José dos Campos por
omissão em relação ao déficit de moradias.
O terreno realmente descumpria sua função social,
mas como dito anteriormente ele não poderia ser desapropriado até saldarem os débitos. E caso fosse desapropriado o artigo 5º da Constituição Federal
estabelece o pagamento de indenização ao proprietário e seria necessário
averiguar se a prefeitura de São José dos Campos ou os governos estadual ou
federal teria condições de arcar com o valor de meio bilhão de reais, o que
provavelmente não seria possível.
E para evitar abusos e o comprimento da lei a
desapropriação deve ser feita pelas autoridades competentes e não através de
esbulhos.
Outra acusação aos magistrados é que eles se isentam de culpa dos ocorridos em Pinheirinho e de acordo com o Código de
Ética da Magistratura, os que julgam são responsáveis por sua decisão. Porém
não era possível ter ciência de todos os eventos que aconteceriam e teve a preocupação
de que após a retirada os moradores não ficassem desamparados, já que na ordem
pede que a prefeitura fosse oficiada sobre a desapropriação. E ela posteriormente cadastrou os habitantes para receber o “aluguel social” e o
“auxílio mudança”.
Também se questiona a proibição da defensoria
pública intervir no caso, todavia, esse órgão não pode se envolver em questões
de direito privado, como era o caso e os habitantes já eram representados por
advogados contratados pela associação de moradores.
Vale ressaltar também
que os representantes legais da comunidade de Pinheirinho não fizeram tudo o
que estava ao seu alcance para garantir a posse da propriedade aos
ocupantes. Existem três tipos de usucapião, sendo o mais comum o pedido que exige 15 (quinze) anos de uso e a não
interferência do proprietário, mas o artigo 10 do Estatuto
da Cidade (Lei nº 10.257/2001) prevê a usucapião coletiva que tem como
requisito a ocupação por 5 (cinco) anos ininterruptos e sem oposição de áreas
urbanas com mais de duzentos e cinquenta metros quadrados por população de
baixa renda com o fim de constituir moradia, com a ressalva de que os
possuidores não sejam proprietários de qualquer outro imóvel. Requisitos que os
moradores de Pinheirinho se enquadravam por não ocuparem todo o terreno e a
entrada com esse pedido não foi realizada.
A
desocupação da comunidade de Pinheirinho continua a ser debatida, com a
ocorrência de violações dos direitos humanos pelas forças policiais, mas ordem
para a desocupação respeita os princípios do direito por garantir a igualdade
perante a lei. Essa visão é questionada principalmente pelos marxistas, que por
sua vez são questionados por weberianos que consideram que métodos marxistas
não abrangem toda a realidade. Considerando o direito brasileiro a ordem de
desocupação foi legal já que manteve a posse de uma propriedade que seria
destinada a quitação de dívidas. Concluindo que o principal problema de
Pinheirinho não foi à ordem expedida e sim sua aplicação.
João Pedro Costa
Moreira - 1º Ano Direito Noturno
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