Émile Durkheim elaborou uma importante teoria no que se refere às sociedades: além do fato social, defendeu modos de união dos indivíduos de um grupo seja mecanica, seja organicamente. Somando-se a isso, relacionou o conceito de crime e de pena abrangendo paixões públicas e privadas.
Segundo o autor, nas sociedades primitivas, um mesmo sentimento, era partilhado por, praticamente, todos os seus integrantes que se uniam justamente nesse motivo (trata-se da chamada consciência coletiva). Diante disso, no caso de haver um comportamento contrário a essa consciência comum – crime – a resposta consistia numa pena aplicada de maneira difusa (pela população) com o intuito simplesmente de punir, vingar-se, explicitando, assim, uma espécie de paixão pública que “alimentava” a punição. Esta reação passional, por sua vez, poderia ultrapassar o criminoso, atingindo também sua família, companheiros.
Para a sociedade atual, por conseguinte, Durkheim esperava, com a solidareidade orgânica, uma maior racionalidade e desprendimento de conceitos que unem fortemente indivíduos que compõem a corpo social. A pena, nesse caso, não seria somente um ato expiatório, mas um temor para evitar más vontades (idéia de conservação). Tal fato, antes exercido pelos indivíduos, hoje é feito por instituições responsáveis pelo julgamento, pessoas instituídas com o poder e com a responsabilidade de julgar, bem como de executar a punição. Todavia, há resquícios de parte da população “executar penas” à sua vontade.
Caso Nardoni, Realengo, estupros, vários são os acontecimentos contemporâneos de pessoas que, alimentadas por paixões privadas, contrariam sentimentos comuns à maioria da população a qual, une-se, provocando linchamentos, condenam parentes dos sujeitos envolvidos. Diante disso, atenho-me nesse texto, no fato de paixões públicas serem de tal intensidade que provoquem comportamentos tão ruins quanto, ou até piores que os atos cometidos.
Em complementação a tais dados, observa-se, no âmbito jurídico, a incorporação de regras morais, construídas ao longo do tempo. Tal característica revela a presença de sentimentos comuns à sociedade no ordenamento, fato este que confere segurança ao grupo social, ao impedir e punir comportamentos “privados”, feitos a bel prazer de alguém. “A ordem jurídica tem, assim, como premissa o estabelecimento dessas restrições, a determinação desses limites aos indivíduos, aos quais todos indistintamente devem se submeter, para que se torne possível a coexistência social”(MONTEIRO, Washington de Barros. v.1, p.2)
Desse modo, observa-se,portanto, a maior força de paixões públicas em relação às privadas no contexto atual. Com isso, não se trata de impedir ou suprimir a individualidade do ser, uma vez que possui sua liberdade. Esta por sua vez, não justifica comportamentos como os supracitados, que ferem o outro indivíduo. Caso isso aconteça, gera-se revolta sim; no entanto, existem os responsáveis pela pena deste criminoso, não se justificando linchamentos, “justiça pelas próprias mãos”, nem barbáries contra a família daquele que desviou as normas as quais garantem segurança. Diante disso, paixões privadas, logo, não devem ser sinônimas de liberalidade; assim como paixões públicas não devem significar “vingança erga omnes”.
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