Rafael estava ansioso com
o seu novo emprego em um renomado escritório de advocacia, chamado de Quiroga.
Em seu primeiro dia de trabalho, vestiu o seu terno cinza e simples, entrou em
seu carro “popular” e foi trabalhar. Na entrada do Quiroga, percebeu que havia
algo errado, quando foi questionado pelo porteiro se ele realmente era
funcionário do escritório. Adentrando em sua sala percebeu olhares de desdém dos
demais advogados, não se atentando a esses fenômenos, foi direto ao Fórum onde seu
chefe disse por e-mail que ele teria uma audiência.
Chegando
ao Fórum os mesmos fenômenos estranhos se repetiram, quando se identificou como
funcionário do Quiroga o porteiro o questionou se era funcionário mesmo. E
todos os demais tramites foram custosos, até que alguém do Fórum, desconfiado e
incomodado, ligou para o dono do escritório que achou melhor enviar outro advogado
com mais tempo de casa.
No
escritório de advocacia Rafael estava atônito. Respondia para seu chefe, que
sempre havia trabalhado dessa maneira e nunca houve nenhum problema parecido
com esse. Seu chefe explicou, pacientemente, que agora Rafael era um Quiroga,
tinha que se vestir como um Quiroga, tinha que ser um Quiroga, tinha que viver como
um Quiroga. Entregou a ele uma série de instruções denominadas de Quiroga lifestyle.
As instruções iam desde o terno, que teria que ser Armani, os sapatos, a gravata
e até mesmo o carro que não poderia mais ser popular e nem médio. Rafael ficou surpreso
com tudo, mas achou melhor seguir as orientações. Foi ao shopping, comprou todo
o vestuário seguindo as instruções à risca, utilizou toda sua poupança para financiar
uma Mercedes e foi para casa.
No
dia seguinte, ainda abalado e receoso com todos os acontecimentos do dia
anterior, saiu de casa e foi ao Quiroga advogados, a recepção foi diferente
logo na entrada, onde o porteiro deu bom dia a ele, e o atendeu melhor. No
elevador todos o cumprimentaram e até puxaram assunto com ele. Chegando no
escritório verificou que defenderia Grespan, seu professor de sociologia na faculdade,
que estava sendo processado, acusado de doutrinação, crime tipificado graças ao
projeto escola sem partido.
Chegando ao Fórum, tudo foi diferente. O porteiro o tratou bem e até o juiz mudou o
tratamento em relação a ele. Enquanto conversava com seu professor, uma
advogada foi retirada esperneando do Fórum enquanto gritava que a roupa dela
não significava nada, que aquilo era um absurdo. Por um momento, Rafael a
invejou pela capacidade de contestar e não aceitar essas regras superficiais,
enquanto ele já havia sido “docializado”. Resolveu contar para o professor toda
a sua experiência do dia anterior e tudo o que havia feito para se adequar e
que agora ele era um Quiroga. Grespan, ouvindo tudo o que seu aluno dizia; vendo a
satisfação em sua fala por estar trabalhando no Quiroga advogados; pensando na advogada que
foi retirada esperneando; e lembrando do seu processo movido pelo escola sem partido, disse
espantado: Durkheim ainda vive e como vive!!!
Ricardo da Silva Soares Direito Noturno
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