Em um contexto de conquista de direitos, a Constituição de 1988 – também conhecida como a “Constituição Cidadã” – colocou em pauta uma série de debates sobre a igualdade racial, até então pouco amparada no âmbito constitucional. Dentre uma das propostas, foi exposta “a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil". Nesse sentido, vale ressaltar o atraso histórico para que tais temáticas fossem positivadas, assim como a ineficácia do conteúdo escrito na prática.
A partir dessa visão crítica sobre a perspectiva racial na sociedade contemporânea brasileira, o magiatrado Antoine Garapon já defendia o pensamento de que o indivíduo inserido em um mundo neoliberal está desamparado de seus direitos garantidos por lei. Com isso, ao depararem-se com uma falsa ideia de autonomia democrática, os sujeitos são incapazes de suportar a sua autodeterminação. Sob essa perspectiva, os tribunais ganham considerável protagonismo, fortalecendo, assim, o fenômeno da tutelarização do sujeito (como diz Garapon), uma vez que as pessoas buscam na justiça sua função tutelar, que possa abarcar seus direitos positivados.
Ao analisar essa fragilidade de determinados corpos sociais, vale ressaltar que, mesmo após a Constituição de 88, o acesso ao processo seletivo universitário, por meio de cotas raciais, somente foi garantido por lei em 2012. Dessa maneira, faz-se necessário visualizar a votação dos ministros do STF, a respeito da ADPF 186, no sentido de compreender a causa favorável dos ministros para a utilização de cotas, além da demora para que está decisão fosse colocada em pauta.
Em primeiro lugar, insta citar a percepção de Garapon de que “(...) o direito invade a moral, a intimidade, o antigoverno.” (GARAPON, 1999). Desse modo, os movimentos sociais e as pressões externas, a exemplo das causas raciais estudantis, influenciam na tomada de decisão na Justiça. Ou seja, uma votação majoritária favorável dos ministros na ADPF 186 reflete muito mais os anseios sociais por igualdade de fato, ao invés da posição individual de cada magistrado.
Por fim, o hiato na garantia de “igualdade" racial entre a Constituição de 88 e a realização da ADPF 186, explicitam não só o desamparo das classes desfavorecidas que recorrem à justiça, mas também a necessidade da justiça contemplar as dinâmicas sociais em suas necessidades por representação, ainda mais com a discriminação racial existente há séculos no Brasil.
Gabriel Drumond Rego - Direito Matutino - Turma XXXVIII.
Nenhum comentário:
Postar um comentário