Para
fazermos a análise do julgado e relacioná-lo com o texto de Garapon, é preciso
que, primeiramente, façamos uma contextualização histórica e teórica do tema
abordado no capítulo analisado. Assim, é preciso comentar o protagonismo dos tribunais
e o motivo pelo qual este vem crescendo, começando, claro, pela onda neoliberal
que se inicia nos anos 70 e se estende até os dias atuais.
O
neoliberalismo, prega o afastamento do Estado das relações sociais e de
mercado, como as relações trabalhistas e - tema que é muito recorrente dentro
da doutrina - a desestatização e privatização de segmentos da economia, defendendo
uma abordagem econômica e social que coincide com os princípios do capitalismo.
Esta ideologia neoliberal se fortaleceu na década de 60 e 70 ao lado justamente
do capitalismo, que crescia em todo o mundo no pós-guerra impulsionado pelas
novas tecnologias que resultaram da guerra - principalmente a de comunicação
que garantiria a integração do mundo na chamada globalização - e ideologias
bipolares que imperavam entre as novas potências mundiais. Contava também com o
crescimento vertiginoso da população e a prosperidade que vinha com a aparente
paz, que traziam mais mão de obra e segurança para produzir e crescer.
Mas
o modelo neoliberal é um motor gerador de desigualdades (econômicas e sociais)
que aprofundou o desemprego e abriu brechas para a exploração dos
trabalhadores, que não têm outra opção senão se submeter a condições precárias
de trabalho por um salário de fome. E é diante da fragilidade da situação das
pessoas que não têm mais a proteção do Estado que surge a grande demanda pelo
poder judiciário, que tem o papel de garantir os direitos que estas parecem ter
perdido. E aqui entra Garapon que trata desse assunto no capítulo VI, da chamada
“magistratura do sujeito”, que nada mais é que a busca do indivíduo por seus próprios
direitos.
O que é chamado
protagonismo dos tribunais é, então, o próprio povo que provoca o direito na
esperança de suprir o desamparo do Estado. Uma fala que representa bem este fenômeno
no livro de Garapon é:
“Pela
voz do juiz, o direito se empenha em um trabalho de nominação e de explicitação
das normas sociais que transforma em obrigações positivas o que era, ainda
ontem, da ordem do implícito, do espontâneo, da obrigação social”.
(Garapon, p. 151)
E o julgado
escolhido para a análise deste tema se encaixa perfeitamente, especialmente nas
palavras de Garapon, já que se trata de uma ação de reintegração de posse que foi
negada pelos magistrados, dando o direito de ocupação de uma terra que já possuía
um proprietário a alguém que a daria uma função social.
Resumidamente,
a demanda é dos proprietários de uma terra que não a deram nenhuma função e,
por isso, foi ocupada por pessoas do MST, que a utilizariam provavelmente para
produção. Na ação de reintegração foram apresentados os documentos que provavam
que a terra que era alvo de disputas era de propriedade dos agravantes (que
propuseram a ação), mas ainda assim, após uma votação fundamentada, onde foram
utilizados argumentos como a necessidade – exigida inclusive na constituição federal
– de se dar à terra uma função social, a garantia da dignidade da pessoa humana
e de uma existência digna, e dos objetivos da república constantes nos
primeiros artigos da constituição (Art. 5º), foi decidido, por 2 – 1, que situação
se manteria como estava, com a propriedade sob posse do MST.
É um exemplo
perfeito de como, através dos tribunais, é possível que se faça garantir os direitos
mesmo quando o cenário indica o contrário. Existem, obviamente, problemas nessa
busca pelo judiciário, como a dilatação de seus poderes e o risco da
discricionariedade que a acompanha, mas não podemos dizer, de modo geral, que seu
papel na luta pela garantia dos direitos das pessoas tem sido ruim.
Rodrigo
Beloti de Morais
1º Ano - Noturno
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