Liberdade Para Matar
“A solidão concede ao homem intelectualmente superior uma
vantagem dupla: primeiro a de estar só consigo mesmo; segundo, a de não estar
com os outros. Esta última será altamente apreciada se pensarmos em quanta coerção,
quanto dano e até mesmo quanto perigo toda a convivência social traz consigo. ”
(Schopenhauer)
(Schopenhauer)
Sociólogo que elaborou uma série de teorias
acerca do fato social, Émile Durkheim discorreu sobre os funcionalismos
recorrentes na explicação dos fatos sociais. Para ele, a sociedade funciona
como um organismo, portanto todos os seus membros trabalham pela sua manutenção
e por seu equilíbrio e, caso uma das partes não cumpra sua função, o organismo,
isto é, a sociedade, é prejudicado como um todo.Para isso,são criadas
instituições que mantêm esse equilíbrio e cujo mau funcionamento desregula a
sociedade.Tomando como base esse conceito,podemos analisar no Brasil,em que as
instituições como mecanismos capazes de manter a ordem social são consideradas
falhas,um grande senso de impunidade por parte da população,o que acabou
gerando o fenômeno dos linchamentos.
Segundo
o pensador, há uma causa eficiente existente entre crime e punição, sendo que “a
função desta está vinculada a resposta oferecida não ao delito em si, mas a consciência
coletiva”. Assim, a punição é instituída não para realmente punir os criminosos,
mas sim como uma maneira de promover o equilíbrio entre o meio social. Exemplo
disso são as penas dadas no Oriente Médio (onde as instituições punitivas são
consideradas em bom funcionamento), no qual a pessoa que foi de algum modo
agredida pode escolher a pena de seu agressor, pena essa que varia de acordo
com a pressão coletiva pelo grau de intensidade do crime cometido, o que gera
uma satisfação por parte do coletivo.
Já dentro
da sociedade brasileira há a sensação de impunidade devido ao mau funcionamento
de diversas instituições, o que provoca um desequilíbrio e gera na consciência coletiva
uma sensação de revolta e um senso de “fazer justiça”, gerando os chamados linchamentos.
Um exemplo destes, que abalou parte da comunidade por seu forte apelo, foi a
tortura de um jovem negro no Rio de Janeiro, que foi amarrado a um poste e
linchado por vários homens. Esse caso foi discutido por vários meios de comunicação,
sendo que em um deles uma jornalista disse compreender a atitude dos agressores
e criticou os defensores dos direitos humanos. Portanto, sendo as instituições
consideradas falhas, o cidadão encontra-se na ilusão de possuir um dever que
não lhe cabe: o direito de punir e, dependendo da intensidade do crime, a
liberdade para matar. Porém, essa liberdade só é possível de ser exercitada
quando em grupo, já que neste cada um é arrastado por todos, máxima exposta por
Durkheim ao abordar a exterioridade e coercibilidade do fato social.
O fato das instituições
brasileiras terem perdido sua função sem a modificação de sua aparência é para
muitos incontestável. Para aqueles que nisso acreditam, é necessário que haja
uma nova forma de manter a ordem, colocada no fenômeno dos linchamentos.
Contudo, essa ordem que esse mecanismo violento impõe não é nada mais do que
passageira (a exemplo a ordem estabelecida pelo governo popular durante a
Revolução Francesa) e, portanto, nada pode fazer para manter o equilíbrio social,
apenas para danificá-lo ainda mais.