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segunda-feira, 26 de maio de 2025

A construção da raça e a legitimação da autoridade

A obra Racismo Estrutural, de Silvio Almeida, apresenta a noção de raça como uma construção social e histórica diretamente vinculada à organização política e econômica da modernidade. A partir do século XVI, com a expansão colonial europeia, a classificação racial passou a funcionar como uma tecnologia de dominação, legitimando a exploração de povos não europeus e naturalizando relações de poder assimétricas. Essa estrutura racializada, longe de ser um desvio do sistema, é parte constitutiva das instituições e da ordem social moderna. A partir da teoria da autoridade de Max Weber, é possível compreender como o conceito de raça foi instrumentalizado dentro das formas de dominação legítima para sustentar hierarquias políticas e sociais por meio da institucionalização da desigualdade.

Weber define autoridade como a possibilidade de se obter obediência dentro de um sistema de dominação legitimado socialmente, seja por tradição, carisma ou legalidade racional. No contexto histórico abordado por Almeida, a raça tornou-se um fundamento dessa dominação, inserida nas estruturas jurídicas e burocráticas que configuram a autoridade legal-racional moderna. A escravidão, o colonialismo e o apartheid, por exemplo, foram praticados dentro de sistemas considerados legítimos à época, reforçando a ideia de que a legalidade pode coexistir com a injustiça, quando baseada em interesses de dominação. Assim, a autoridade institucional se apoiou na construção racial para manter uma ordem social que, embora formalmente racional, era sustentada por violências e exclusões sistemáticas.

A crítica de Almeida à naturalização das desigualdades raciais converge com a análise de Weber sobre a fragilidade da legitimidade quando dissociada da justiça substantiva. A autoridade, segundo Weber, só se mantém estável se for reconhecida como legítima pelos dominados. No entanto, quando o Estado e suas instituições reproduzem desigualdades raciais sob o manto da neutralidade legal, há uma crise de legitimidade que exige reformulação das estruturas de poder. Compreender a raça como um instrumento de dominação implica perceber que a autoridade política e jurídica não é neutra, mas historicamente comprometida com projetos de controle social, sendo necessário questionar seus fundamentos para promover uma ordem verdadeiramente democrática e igualitária.

Portanto, a articulação entre Silvio Almeida e Max Weber revela que a problemática da raça na história não se limita ao preconceito individual, mas envolve a forma como o poder é estruturado, legitimado e exercido. A autoridade institucional moderna, ao se constituir com base em classificações raciais, tornou-se cúmplice da perpetuação do racismo estrutural. Enfrentar esse problema exige, além da crítica social, uma reconfiguração das formas de autoridade, tornando-as compatíveis com os princípios de justiça, equidade e reconhecimento da diversidade humana. Afinal, como ensina Weber, toda dominação precisa ser legitimada — e essa legitimidade não pode ser construída sobre a exclusão de corpos e vozes racializados.

Jessyca Pacheco Almeida, primeiro semestre, direito matutino.

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