A teoria da dominação simbólica, proposta por Pierre Bourdieu, é uma ferramenta crucial para compreender a dinâmica do racismo estrutural, especialmente à luz das reflexões do jurista e filósofo brasileiro Silvio Almeida. Ambos pensadores, embora partam de tradições distintas, convergem na análise de como a opressão se manifesta não apenas em ações explícitas, mas, sobretudo, nos modos como as estruturas sociais e simbólicas naturalizam a desigualdade racial.
Segundo Bourdieu, a dominação mais eficaz é aquela que se exerce simbolicamente — isto é, quando os valores e significados da classe ou grupo dominante são interiorizados como legítimos por toda a sociedade, inclusive pelos grupos dominados. Essa dominação simbólica atua por meio das instituições sociais — como a escola, a mídia, o direito, e até a linguagem — que reproduzem as hierarquias existentes, fazendo com que desigualdades sociais e raciais sejam percebidas como naturais, meritocráticas ou inevitáveis.
Silvio Almeida, por sua vez, ao conceituar o racismo estrutural, argumenta que o racismo está entranhado na própria organização da sociedade. Ele não é um desvio do sistema, mas parte fundamental de seu funcionamento. O racismo, segundo Almeida, estrutura as instituições, molda os comportamentos e regula o acesso a direitos, oportunidades e espaços de poder. Assim, o racismo estrutural é aquele que atravessa o jurídico, o econômico, o político e o simbólico — ou seja, é sistêmico, cotidiano e muitas vezes invisível.
É nesse ponto que a leitura de Almeida se entrelaça com Bourdieu. A violência simbólica descrita por Bourdieu — a aceitação inconsciente da inferiorização — é um dos mecanismos pelos quais o racismo estrutural se sustenta. Quando uma criança negra entra numa escola que ignora ou desvaloriza sua história, sua estética e sua cultura, ela é submetida a um processo simbólico de apagamento que a afasta de si mesma e a coloca em desvantagem sem que haja, necessariamente, um ato racista individual. A estrutura fala mais alto que a intenção.
Além disso, Silvio Almeida destaca que o racismo estrutural está articulado com outras formas de opressão, como o classismo e o patriarcado — o que Bourdieu também analisa ao tratar das interseções entre capitais econômicos, sociais e culturais. Ambos autores mostram que a dominação não se limita à imposição direta, mas se sustenta por meio de normas, expectativas e padrões que operam sob o véu da neutralidade.
Portanto, pensar o racismo estrutural com base em Silvio Almeida e Bourdieu implica reconhecer que a transformação social exige muito mais do que punir atos racistas isolados: é preciso desmontar as estruturas simbólicas e institucionais que tornam o racismo um componente invisível, porém fundamental, da vida cotidiana. Essa desconstrução passa pela valorização ativa de outras epistemologias, pela reforma das instituições e pela disputa do imaginário social — um campo onde a dominação simbólica atua com especial força.
Felipe Ferreira Gomes - 1Ano Direito (Noturno)
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