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segunda-feira, 26 de maio de 2025

Autoridade e Racismo: Um Diálogo entre Max Weber e Silvio Almeida

O conceito de autoridade, desenvolvido por Max Weber, é um dos pilares fundamentais para a compreensão das estruturas sociais e das formas legítimas de dominação nas sociedades modernas. Segundo Weber, a autoridade é uma forma de dominação legítima, ou seja, uma situação em que uma pessoa exerce poder sobre outras, com base na crença de que tal poder é válido e legitimo, isto é, a aceitação da ordem social como justa pelos subordinados. Já Silvio Almeida, em Racismo Estrutural, parte da crítica às estruturas sociais perpetuadoras de desigualdades raciais para demonstrar como o racismo não é apenas um fenômeno individual, mas uma lógica profundamente enraizada nas instituições. Desse modo, é possível realizar um diálogo entre os dois autores, uma vez que, as formas legítimas de exercer autoridade, identificadas por Weber, foram instrumentalizadas para sustentar estruturas racistas, como as descritas por Silvio Almeida.

Segundo Marx Weber, a autoridade representará uma ordem e exercerá dominação se esta apresentar validade, por isso, o autor classifica a autoridade legítima em três tipos ideais: tradicional, carismática e legal-racional. Cada uma dessas formas se baseia em um tipo específico de crença, seja nos costumes e nas santidade das tradições ou nas qualidades pessoais do líder, que justificam a obediência dos subordinados ao comando da autoridade. Em sociedades modernas, prevalece a autoridade legal-racional, exercida por meio de normas jurídicas, burocracias e sistemas legais impessoais. No entanto, essa racionalidade não garante neutralidade social ou justiça, pois, a dominação é sustentada por relações sociais concretas, muitas vezes atravessadas por interesses de classe, gênero e, neste caso, raça.

Para Silvio Almeida, os conceitos de raça e racismo não são naturais, mas sim construções sociais e históricas. Segundo o autor, a ideia de raça seria uma elaboração para justificar hierarquias sociais, enquanto o racismo deveria ser entendido como um elemento estruturante das instituições sociais, jurídicas, econômicas e políticas. Ele argumenta que o racismo não é apenas um produto de atitudes individuais preconceituosas, mas um sistema que organiza desigualdades e distribui privilégios com base no conceito de raça. Nesse sentido, as instituições modernas, inclusive aquelas fundadas sob a legalidade e racionalidade, não estão imunes ao racismo, visto que, a própria autoridade legal-racional pode operar de forma a legitimar práticas discriminatórias sob o verniz da neutralidade burocrática.

Assim sendo, ao correlacionar Weber e Almeida, é possível perceber como o conceito de autoridade e sua necessidade de validação, por meio de crenças instauradas, religião ou leis, foi amplamente empregado para a consolidação do ideal de raça e a construção de sociedades racistas, visto que, ao longo da história, para exercer dominação sobre povos distintos, considerados inferiores, as autoridades vigentes utilizaram-se de correntes filosóficas, como o determinismo biológico, correntes religiosas e normas jurídicas como arcabouço para legitimar a relação de poder desenvolvida, a exploração, a escravidão, o imperialismo e subjugar determinados grupos sociais, sob a prerrogativa da tradição, legitimidade e obrigatoriedade.

Ademais, a autoridade legal-racional, embora aparentemente impessoal, pode reproduzir desigualdades raciais ao aplicar normas e exercer poder dentro de um contexto já estruturado pelo racismo. Por exemplo, o sistema judiciário frequentemente legitima ações que afetam de forma desproporcional a população negra, como por meio do encarceramento em massa e da seletividade penal. Isso mostra que, de acordo com Weber, a legitimidade é uma construção social que depende da aceitação dos dominados. No entanto, Silvio Almeida problematiza essa aceitação ao demonstrar que, em sociedades racialmente hierarquizadas, os mecanismos de legitimação operam a partir de exclusões históricas e estruturais. Assim, a autoridade institucional, ainda que racional-legal, pode manter e reproduzir formas de dominação racial, sob a aparência de legalidade.

Portanto, a articulação entre o conceito weberiano de autoridade e a crítica de Silvio Almeida ao racismo estrutural permite uma compreensão mais profunda dos mecanismos sociais utilizados para conferir validade a autoridade e a dominação, e que, esta autoridade, ainda que formalmente legal e racional, pode se constituir sobre alicerces de desigualdade racial, reproduzindo privilégios e exclusões. Nesse sentido, ao relacionar Weber e Almeida, temos uma visão teórica mais ampla para compreender como o poder se legitima e se legitimou ao longo da história, como também, a maneira que o racismo opera silenciosamente nas engrenagens da autoridade moderna.


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