A teoria da dominação legítima de Max Weber oferece importantes contribuições para a compreensão do racismo estrutural, especialmente quando articulada às ideias desenvolvidas por Silvio Almeida. Embora Weber tenha se concentrado na análise das formas de autoridade e organização social, sua noção de dominação legal-racional permite refletir sobre como o racismo pode operar silenciosamente por meio de instituições modernas, burocráticas e supostamente neutras.
Weber definiu a dominação legal-racional como aquela baseada em regras impessoais e em sistemas burocráticos que operam com base na legalidade. Em sociedades modernas, as instituições — como o Estado, o sistema jurídico, a educação e o mercado — são legitimadas pela crença na racionalidade e na imparcialidade das leis. No entanto, como Silvio Almeida argumenta em sua obra Racismo Estrutural, essa pretensa neutralidade das instituições é ilusória: as estruturas sociais carregam, em sua própria formação, os traços históricos do racismo, do colonialismo e da escravidão.
Enquanto Weber se preocupava com o modo como a dominação se mantém por meio da obediência voluntária a sistemas legais, Almeida demonstra que essa obediência muitas vezes se dá em um contexto onde a própria estrutura legal foi moldada para proteger interesses brancos e manter a exclusão racial. Assim, o racismo estrutural se manifesta justamente nas engrenagens "normais" do funcionamento institucional, nas políticas públicas aparentemente neutras, nos sistemas de avaliação meritocráticos e nos critérios burocráticos que reproduzem privilégios raciais sob o manto da legalidade.
Por exemplo, a forma como o sistema de justiça criminal opera no Brasil — punindo mais severamente pessoas negras, mesmo com leis "iguais para todos" — revela a continuidade de uma dominação estrutural que é, ao mesmo tempo, legal e racializada. Como Almeida enfatiza, o racismo estrutural não é um acidente ou anomalia dentro do sistema: ele é parte do próprio funcionamento do sistema. E, como Weber já havia apontado, a burocracia tende a se tornar um fim em si mesma, reproduzindo a ordem existente sem questionar seus fundamentos morais ou históricos.
Ao relacionar os dois autores, fica claro que a dominação legal-racional descrita por Weber oferece o “terreno simbólico” e organizacional para que o racismo estrutural, conforme descrito por Almeida, se perpetue sob formas sutis, institucionais e amplamente legitimadas. É essa naturalização do funcionamento desigual das instituições que torna o racismo estrutural tão resistente e difícil de ser enfrentado apenas com mudanças legais formais.
Portanto, combater o racismo estrutural exige mais do que criar leis antirracistas ou punir atos individuais de preconceito: é necessário questionar as estruturas de dominação que, sob a aparência de racionalidade e imparcialidade, seguem reproduzindo desigualdades profundas. É preciso desmascarar a falsa neutralidade das instituições e reconstruí-las com base em justiça social e reparação histórica.
Felipe Ferreira Gomes 1 ano Direot (NOTURNO)
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