Em sua obra “Racismo Estrutural”, o advogado, filósofo e professor Silvio Almeida pretende analisar alguns aspectos do racismo nunca compreendidos profundamente em períodos anteriores. No entitulado capítulo “Raça e Racismo”, Almeida argumenta que a etimologia do termo “raça” advém das classificações que indivíduos, durante toda a cronologia mundial, sempre insistiram em fazer: primeiro, entre plantas e animais; depois, expandiram-se, também, à humanidade. Nesse sentido, a história das raças está intrinsecamente conectada à história da constituição política e econômica das sociedades contemporâneas, sendo a fusão de todas as suas tradições e valores a causa principal da tal mania humana de classificar tudo e todas as coisas, colocando conceitos, ideias, pensamentos e até mesmo seres vivos em suas devidas “caixinhas”. Ao investigarmos o curso dos acontecimentos históricos mais marcantes, é possível identificar a divisão supracitada projetada de maneira física na coletividade: o Apartheid, que vigorou na África do Sul durante 46 anos, era, de modo bastante simplista, um método de classificação humana, o qual atribuía a uma das classes – a branca – o poder completo de dominação.
A partir da perspectiva apresentada, é possível questionar os motivos pelos quais a coletividade, desde os primórdios, sempre foi tão incentivada a manter suas categorizações e, com isso, perpetuar a segregação e o racismo. Destarte, e para que a nossa análise possa ser melhor compreendida, a filosofia de Max Weber traz consigo o conceito de “ação social”, ou seja, aquela que, dotada de sentido subjetivo, é orientada pelo comportamento de outros sujeitos. Logo, a ação social pode ser definida com base em quatro classes: racional com relação a fins – na qual a ação é estritamente racional –, racional com relação a valores – na qual o que orienta a ação é o valor, seja este ético, religioso, político ou estético –, tradicional – que tem como fonte motivadora os costumes ou hábitos arraigados – e afetiva – em que a conduta é movida por sentimentos –, sendo essa tipologia fundamental para compreender como determinadas condutas são socialmente motivadas e como as pessoas atribuem significado às suas práticas no contexto das relações sociais; Weber afirma, ainda, que a ação social necessita de sentido, principalmente, para aquele que a pratica. Nessa ótica, o racismo pode ser entendido como uma forma de ação social que, apesar de ter cunho racional (visando manter privilégios, por exemplo), valorativo (guiado por convicções ideológicas) e afetivo (o medo, a hostilidade e o desprezo são sentimentos de praxe na prática racista), origina-se, sobretudo, de raízes profundas e tradicionais da sociedade – como já observado por Silvio Almeida, o racismo é reproduzido por meio de instituições, normas e práticas que aparentam neutralidade, mas que, na realidade, operam para manter desigualdades raciais profundamente cravadas no contexto histórico e social brasileiro desde a época em que éramos colônia portuguesa. É o chamado “racismo estrutural”.
Ao integrar as abordagens de Silvio Almeida e Max Weber, é possível afirmar que o racismo estrutural se manifesta por meio de ações sociais que, mesmo quando não intencionalmente discriminatórias, reforçam e legitimam estruturas de exclusão racial. A teoria weberiana oferece meios para compreender como os indivíduos participam da manutenção dessas estruturas através de ações cotidianas que, frequentemente, são naturalizadas – como piadas e brincadeiras de cunho racista, por exemplo. A contribuição de Almeida, por sua vez, amplia essa análise ao destacar o caráter sistêmico do racismo e sua articulação com a lógica de funcionamento das instituições sociais. Portanto, a relação entre a teoria da ação social e a concepção de racismo estrutural permite uma assimilação mais abrangente do racismo como prática social. Esse debate revela que o combate ao racismo exige não apenas a transformação de atitudes individuais, mas também a reconfiguração das estruturas sociais e institucionais que mantêm viva a desigualdade racial. Trata-se, assim, de um desafio que envolve tanto mudanças de comportamento quanto a revisão crítica dos sentidos atribuídos às ações sociais e das normas que sustentam a organização da sociedade.
Ana Carolina Tiozzo Mascarenhas, 1º ano de Direito (matutino). Texto relacionando “Raça e Racismo”, de Silvio Almeida, com o conceito de “ação social” proposto por Max Weber.
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