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segunda-feira, 26 de maio de 2025

Racismo Estrutural e Necropolítica: resultados da Dominação em uma Estrutura Social Elitista

 

Weber caracteriza a dominação não como o uso puro e simples da força ou da coerção, uma vez que essa, por si só, não se sustenta, tornando-se volátil. Para Weber, a dominação ocorre a partir da crença na legitimidade do poder. Assim, o conceito de dominação oferece suporte e dialoga com a teoria de Silvio Almeida, em seu livro “Racismo Estrutural”, na medida em que ele demonstra como as estruturas sociais foram historicamente construídas, organizadas e programadas para garantir a dominação das elites brancas sobre a população negra.

Nesse contexto, a dominação não se restringe à opressão ou à perseguição explícita, mas torna-se parte de um sistema legitimado, naturalizado e reproduzido cotidianamente. Esse fenômeno também se relaciona com o conceito de necropolítica, de Achille Mbembe, que evidencia como o poder se manifesta na decisão sobre quem vive e quem morre — ou seja, quem será protegido pelo Estado e quem será deixado à própria sorte, exposto às péssimas condições de vida, saúde, saneamento e segurança, sendo, portanto, abandonado por quem deveria assegurar seus direitos básicos.

Dessa forma, a morte passa a ser, muitas vezes, utilizada como estratégia de governança, uma política voltada à manutenção de interesses específicos. O racismo, ao autorizar a desumanização de determinados grupos, permite que estes sejam tratados como matáveis ou descartáveis, gerando impactos que persistem até os dias atuais. Populações negras, periféricas e indígenas são os principais alvos da necropolítica. Assim, sua morte não se restringe ao aspecto biológico, mas também resulta da privação das condições mínimas de existência. Isso se reflete diretamente nas esferas social e econômica, uma vez que viver em ambientes insalubres, sem direitos trabalhistas, sem acesso adequado à saúde, à educação, ao saneamento básico e à moradia expõe esses grupos ao sofrimento, à degradação e à morte social, impedindo-os de construir perspectivas de futuro.

O racismo, portanto, se sustenta em diversas manifestações da dominação. A primeira é a dominação tradicional, herança da época colonial, escravocrata e patriarcal, que normalizou a desumanização, a exploração e os preconceitos contra negros e indígenas, legitimando tais práticas por meio de uma mentalidade social historicamente enraizada.

A segunda manifestação é a dominação legal-racional, expressa no funcionamento de instituições, do judiciário, das burocracias e das estruturas econômicas, que, embora presumidamente neutras, frequentemente operam na proteção dos interesses das elites brancas, em detrimento dos direitos, da dignidade e do bem-estar dos grupos historicamente marginalizados. Isso se evidencia, por exemplo, no fato de a população negra e parda compor a maior parte das pessoas em situação de pobreza, miséria, encarceramento e moradoras de favelas, além de serem as principais vítimas da violência policial. Percebe-se, portanto, que tais condições não são fruto do acaso, mas de um sistema estruturado para permitir sua reprodução, sem oferecer os meios necessários para transformação, o que leva, muitas vezes, à morte social desses indivíduos e à perpetuação do racismo, frequentemente não punido.

Por fim, a dominação carismática manifesta-se por meio de lideranças e figuras influentes que difundem discursos como o da meritocracia, negando as desigualdades estruturais. Esses discursos mascaram a realidade, impedindo que boa parte da população perceba as injustiças que afetam cotidianamente os grupos marginalizados. Além disso, deslegitimam as denúncias de racismo, transferindo para o indivíduo a responsabilidade pela sua condição, como se fosse resultado exclusivo de suas escolhas pessoais e não de um sistema opressor e excludente.

Portanto, enquanto para Weber a obediência resulta da aceitação da legitimidade do poder, Silvio Almeida demonstra que o racismo estrutural é sustentado justamente pela crença de que ele é algo natural, racional ou, muitas vezes, disfarçado, tornando-se invisível para parte da sociedade. O racismo, portanto, não é um problema isolado, nem responsabilidade de indivíduos imorais, mas sim um fenômeno coletivo, que precisa ser compreendido a partir dos seus aspectos históricos e atuais, os quais criaram e sustentam um sistema excludente e racista, que protege os interesses de poucos em detrimento da maioria. Dessa forma, o racismo não é uma exceção, mas a própria regra de funcionamento das sociedades estruturadas na lógica capitalista e colonial.

Diante disso, torna-se fundamental que esses grupos sejam reconhecidos como sujeitos de direito, mobilizando os instrumentos legais tanto para garantir melhores condições de vida quanto para dar voz às suas reivindicações. Além disso, é necessário utilizar o próprio direito como ferramenta para questionar e deslegitimar as estruturas de dominação. Assim, seria possível mitigar as práticas opressoras, que deixariam de ser vistas como legítimas. Ademais, ao amplificar as vozes desses grupos, mais pessoas poderiam perceber a realidade, não mais sendo enganadas pelas falácias reproduzidas por líderes e meios de comunicação que sustentam esse sistema desigual.

Gustavo Zoca Goulart de Andrade - primeiro ano de direito noturno 

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