Segundo Descartes, o mundo se assemelha a uma máquina, ou
seja, a junção de todos os componentes necessários para o seu funcionamento
estão inter-relacionados e, portanto, uma mudança nessa conjuntura pode resultar
em uma alteração na sociedade. O chamado neofascismo, contemporâneo a diversos
cenários políticos em âmbito internacional (seja na Europa, nos EUA ou até
mesmo no Brasil), se baseia, sobretudo, em uma lógica de "correção da
sociedade". Fortemente moralista, conservadora e antirrevolucionária, essa
expressão busca convencer os cidadãos de que há um inimigo comum que
impossibilita o progresso da nação, seja um partido, um grupo étnico ou um
comportamento. Logo, o processo para se alcançar o fim idealizado pelos
fascistas, além de possuir uma abordagem de manipulação possível somente com o
uso das tecnologias científicas, consiste na eliminação absoluta e autoritária
desse inimigo e na inserção de novas engrenagens na "máquina" que
seria o mundo.
Com isso, a ciência torna-se uma ferramenta importante para a
ascensão de movimentos extremistas, como o neofascismo, uma vez que seus
discursos giram em torno de acusar a oposição (neste caso, as "peças"
atuais da máquina) por alguma situação de crise na sociedade e propor uma outra
visão de mundo e de organização social ("peças" novas a serem
inseridas) pautada no sectarismo e na concepção de que determinados grupos da
sociedade não são dignos de direitos.
Em analogia à ideia de torturar a natureza para se obter seus
segredos, presente na literatura baconiana, os projetos neofascistas visam a
dominação da natureza em um sentido amplo, o que inclui, por consequência, os
seres humanos. O atual governo de Jair Bolsonaro, cujo período eleitoral
anterior à vitória do candidato foi marcado pelos elementos básicos que
configuram o fascismo, como o nacionalismo exacerbado e os discursos de ódio,
demonstra uma característica típica de dominação moderna: a eliminação de
direitos, a exemplo da chamada Reforma da Previdência, medida proposta pelo
governo para o aumento da exploração da mão de obra humana, justificada sua
necessidade com base em estatísticas econômicas que supostamente indicam um "déficit" nos cofres
públicos. Mais uma vez, a abordagem científica foi utilizada por neofascistas
para a tentativa de implementação de suas propostas antipopulares e que priorizam os interesses das camadas mais ricas da sociedade.
Diante disso, pode-se dizer que a aplicação das ciências de
uma forma geral, seja na área bélica em que atuou o nazismo com suas inovações
tecnológicas genocidas ou na área da ciência política em que atuou Bolsonaro
com sua propaganda empírica, contribuíram no passado e continuam contribuindo
para a ascensão e a estabilização de governos autoritários, uma vez que as
técnicas desenvolvidas nas campo da medicina, da filosofia, da psicologia ou
qualquer outra que seja, quando introduzidas na sociedade, alteraram as
"engrenagens" que constituem a "máquina do mundo", podendo
levar desde crimes humanitários até a desequilíbrios ecológicos. A
dificuldade está, justamente, na conciliação do uso das técnicas científicas e dos processos de transformação social, combinação a qual pode ser utilizada
tanto a favor quanto em oposição aos modelos autoritários.
Durante toda a sua campanha, Jair Bolsonaro associava a
responsabilidade perante a crise pela qual passava o país ao Partido dos
Trabalhadores (PT) e, conforme o decorrer dos meses e seu crescimento nas
pesquisas eleitorais, a imagem do partido foi deteriorada, estando o termo
"petista" sujeito a uma conotação muito diferente daquela tida por
outros partidos, como "psdbista" ou "pesselista". Trata-se
de um caso típico da criação de um ídolo do foro na política, isto é, a
"culpa" por todas as mazelas da sociedade brasileira foi atribuída a
um único ente de maneira empírica, ressaltando diariamente quais eram os responsáveis
pela crise e, desse modo, alienando a população através do pensamento de que a
corrupção, o recesso econômico e demais fatores estavam ligados direta e
exclusivamente aos “inimigos da nação”, neste caso, “os vermelhos”, expressão
com a qual Bolsonaro designava toda e qualquer ideologia que não fosse
convergente ao seu projeto direitista reacionário.
Luiz Carlos Ribeiro Júnior - Direito Noturno
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