Um dia
pedi para vovó me preparar uma vitamina de fruta e ela prontamente atendeu o
meu pedido, me oferecendo todas as opções disponíveis: morango, banana e mamão.
Percebi, contudo, que em cima da mesa tinha uma deliciosa manga e achei
estranho que ela não tivesse me oferecido essa opção. Logo, falei “Vó, eu quero
uma vitamina de manga! ”. Para minha surpresa, ela abriu os olhos espantada e
disse “Querida, não se mistura leite com manga. A sobrinha da sua tia foi parar
no hospital por causa disso”. Convencida do perigo de se misturar esses dois
alimentos, pedi contrariada para que ela fizesse uma vitamina de banana.
Porém,
a manga continuava em cima da mesa, extremamente cheirosa e apetitosa. Não
consegui resistir a curiosidade e quando vovó foi ao mercado, resolvi, então,
experimentar aquela mistura. Achei muito gostosa e pensei “se eu for parar no
hospital pelo menos valerá a pena”. Mas as horas passaram e tudo ficou bem.
Anos
depois e ainda penso nesse dia. Infelizmente não posso contar minhas
descobertas para vovó, que ficaria perplexa ao descobrir que tudo não passava
de uma invenção dos senhores do engenho para que os escravos não bebessem o seu
precioso leite junto com as mangas de suas fazendas.
Analisando
esse episódio, penso em como minha curiosidade infantil me levou a questionar
uma crença pré-estabelecida e antecipada há anos na sociedade. Isso me remete
ao método cartesiano, o qual é pautado na dúvida como princípio para chegar a
clareza. Vovó também gostaria de estudar ele e pensar em como devemos controlar
nossas convicções para entender o mundo um pouco melhor.
Vovó
era muitas coisas. Fazia parte de uma ONG que auxiliava moradores de rua em São
Paulo e sempre rebatia as críticas de quem dizia que ela protegia vagabundo.
Ela adoraria saber que Francis Bacon defendia a “cura da mente humana”, que
dizia que o apenas o simples raciocínio da mente poderia nos levar a um erro.
No caso de moradores de rua, deve-se analisar toda a experiência social vivida e
não apenas o ato observável.
Vovó adorava
a natureza e cuidava do seu jardim com todo amor do mundo. Ela odiaria ver as
florestas do mundo inteiro sendo queimadas para ao acúmulo de riquezas e
falaria durante horas sobre o filme Ponto de Mutação e suas problematizações
acerca da subversão de um instrumento de transformação funcional para o acúmulo
de capital.
Aprendi
muitas coisas convivendo com minha avó e gostaria de estar compartilhando todas
essas reflexões com ela. Dona Carmen me faz refletir diariamente sobre tudo que
aprendo.
Lorena
Prado Silva – 1° Período Noturno
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