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domingo, 4 de julho de 2021

Fake News em 1600s

 Em meio a atual epidemia do Coronavírus, houve o alastramento de outro surto: o da desinformação. Seja sobre a origem do vírus ou em relação a supostos efeitos colaterais presentes na vacina, recentemente houve a proliferação de notícias falsas, ou fake news, a respeito da pandemia. Esse aumento resulta em aversão em uma parcela cada vez maior da população em se vacinar, aumenta a crença em informações sem base em fatos, porém, obras como o Discurso do Método e Novum Organum revelam, a estrutura que permite a perpetuação de notícias falsas não é algo exclusivo da atualidade

Os rumores a respeito da vacina são vários, com alguns exemplos sendo: presença de chip rastreador, provoca mudança de gênero em quem a toma, transforma pessoas em jacaré, com o próprio presidente Jair Bolsonaro mencionando tal em um evento realizado no final de 2020 em Porto Seguro na Bahia.  A própria alusão do presidente a essa concepção errônea sobre a vacina demonstra o quão difundida essas notícias falsas a respeito da vacina são. Segundo o Datafolha, em agosto de 2020,  9% da população alegou que não iria se vacinar, com o número crescendo para 22% em dezembro do mesmo ano. Esses dados revelam que há uma crescente resistência em se vacinar, com um dos motivos sendo o medo gerado por rumores absurdos a respeito do imunizante.

Com o advento das redes sociais, tornou-se muito mais fácil propagar notícias, porém tamanha facilidade em repassar informação vem ao custo de muita vezes esse dado ser falso, com o estudo denominado "iceberg digital", realizado pela empresa Kaspersky em 2020 revela que 62% dos brasileiros não conseguem reconhecer fake news, demonstrando o quão suscetível a atual sociedade brasileira é a desinformação. Para combater a difusão dessas notícias falsas, é de suma importância a averiguação da informação recebida, algo que o filósofo René Descartes já defendia em seu livro de 1637, Discurso sobre o Método, no qual discursa que alguém deve aceitar como verdade somente aquilo que ele próprio reconheça como tal, independente das pressões externas para que seja a informação seja acolhida. Essa reflexão do pensador francês continua sendo válida na contemporaneidade, pois ao procurar se informar sobre algo e não automaticamente aceitar como verdadeiro um dado quando a recebe diminui as chances de ser vítima de informações falsas, repassadas por quem não realizou tal averiguação.

Entretanto, o advento das fake news não está apenas ligado à simples falta de uma confirmação da procedência dos fatos, sendo também ligada ao emocional dos indivíduos, por exemplo notícias que acusam o governo chinês de ter criado o vírus SARS-CoV-2, patógeno responsável pela atual pandemia. Essas notícias apelam para o medo e o receio, ambos sentimentos exacerbados por políticos como Donald Trump, que realizou a acusação supracitada contra a China, afetando principalmente o julgamento daqueles que já apresentavam aversão ao país asiático, seja por preconceito ou mesmo por acreditar em discursos de políticos como o ex-presidente estadunidense. Esse apelo emocional que nubla o raciocínio e dificulta decisões baseadas em fatos já havia sido identificado pelo ensaísta inglês Francis Bacon em seu livro Novum Organum, publicado em 1620, classificando-a como um ídolo da tribo, por promover distorções da percepção baseadas nas paixões do indivíduo. O fato dessa obra de 401 anos atrás já refletir a respeito dessa obstrução provocada pelos sentimentos demonstra o quão antiga é o mecanismo que permite a proliferação das notícias falsas.

Em suma, a desinformação em relação à pandemia arrisca a saúde de muitos ao provocar medo da vacina naqueles que não averiguam a origem e a veracidade das informações que recebem, muitas vezes de redes sociais. Porém não se pode acreditar que essa tendência é atual, pois pensadores como René Descartes e Francis Bacon já debatiam sobre tal no século XVII.

                                  Rafael Nascimento Feitosa

                                         1º ano de Direito

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