"Ordem e Progresso" é o que está escrito na bandeira brasileira. Essas duas palavras fazem parte do pensamento positivista, criado no século XIX por Augusto Comte e que inspirou a instauração da República no Brasil. A máxima positivista em si é maior: "O amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim". Mas o amor ficou de fora. No positivismo, há uma valorização da ciência e a sociedade para Comte, inclusive, deve ser analisada com o rigor do método científico, em uma busca pelas leis e regras universais que a regem. Nesse sistema filosófico, há a ideia de harmonia social, em que não se fala dos indivíduos e de suas subjetividades, mas sim do coletivo. É preciso que as pessoas aceitem seus papéis sociais para que assim, a ordem, a paz e a coletividade sejam mantidas. E com a ordem mantida, o progresso é obtido. Para os positivistas, o progresso é constante e para ele caminha a humanidade.
No que se refere à manutenção da ordem, é curioso pensar que desde o início da República brasileira, em 1889, a ordem é mantida para o benefício de alguns, geralmente aqueles que detém o podem e cuja ruptura do “status quo” significaria a perda dos privilégios que possuem. A própria República, por exemplo, foi feita para quem? Como escreve o político da época, no Diário Popular do Rio de Janeiro, Aristides Lobo (1838 – 1896): “[...] Por hora, a cor do Governo é puramente militar, e deverá ser assim. O fato foi deles, deles só, porque a colaboração do elemento civil foi quase nula. O povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava”. Então, basicamente, uma República (e consequentemente uma ordem) de que, para quê e para quem?
Contudo, as relações sociais desiguais não são exclusividade do século XIX. No Brasil do século XXI, é no filme “Que horas ela volta” que um retrato
preciso da realidade pode ser encontrado. No bairro do Morumbi [um bairro de
contrastes, diga-se de passagem: se por um lado é lar de elites, por outro,
abriga a segunda maior favela de São Paulo] na cidade de São Paulo, vive uma
família: Dona Bárbara, Doutor Carlos e Fabinho, que tem como empregada Val,
pernambucana que trabalha e mora na casa dos patrões há muitos anos, tendo
inclusive, criado Fabinho. Até certo momento, tudo estava “normal”, até Val
receber uma ligação de sua filha Jéssica, que ficara no Nordeste e agora viria
para São Paulo prestar vestibular, querendo fazer arquitetura na Universidade
de São Paulo (USP). É com a chegada de Jéssica que aquela ordem começa a mudar.
Agora os conflitos, as opressões, as divisões [“ficar pro lado de lá da casa”, o
quartinho de Val, a piscina, entre outras] são mais evidentes e a ordem
estabelecida é impactada. A presença de Jéssica é um afrontamento, incomoda.
Como pode, ela, querer fazer
vestibular? Certamente, Jéssica e Val devem manter suas realidades para que a
família de Dona Bárbara progrida. Mas tudo bem, dias melhores virão.
Jéssica passou no vestibular.
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