“Estranho mimo aquele vaso! Vi-o, / Casualmente, uma vez, de um perfumado / Contador sobre o mármore luzidio, / Entre um leque e o começo de um bordado”. Escrito pelo poeta Alberto de Oliveira, o trecho do poema “Vaso Chinês” carrega a essência da escola literária que ditava as tendências dos séculos XIX e XX: o Parnasianismo. Esse movimento apareceu pela primeira vez na França em oposição às grandes transformações da época, fundamentando-se no princípio da “arte pela arte”, o qual exigia do poeta uma abordagem impessoal, antirromântica, de objetividade temática e perfeição estética. Nesse sentido, o parnasianismo foi responsável por refletir na arte as teorias científicas e filosóficas que caracterizaram o final do século XIX e início do XX, com destaque para as teorias de Augusto Comte, autor do Positivismo.
Em
sua obra “Discurso sobre o Espírito Positivo”, o filósofo francês discorre
sobre a necessidade de uma ciência para o conhecimento sistematizado do mundo
social, a qual teria o estado positivo como último estágio para o entendimento
da sociedade. Segundo o autor, essa doutrina sociológica baseava-se na Teoria
dos Três Estados, logo, os seres humanos passariam pelo estágio teológico dos
mitos e da crença no sobrenatural, pelo estágio metafísico da dúvida e das
máximas negativas e atingiriam o amadurecimento no último estágio, o estado
positivo de progresso e ordem. Para isso, a Sociologia deveria respaldar-se nas
ciências da natureza, sobretudo na Biologia e na Física. Portanto, o sociólogo
deveria fazer um trabalho análogo na sociedade: descobrir e decodificar as leis
sociais, ser um cientista observador e apoiar-se no conteúdo de sua análise.
Desse modo, assim como na temática parnasiana, o pesquisador deveria adotar uma
postura passiva diante dos fatos, recusando investigar a origem e o destino
final dos acontecimentos, uma vez que a busca pela transformação social resultaria
em um “revolucionarismo” insustentável.
Além
disso, o resgate da moral é indispensável para a construção de uma sociedade
harmônica segundo Comte. Não a moral egoísta do pensamento religioso, mas sim
uma moral que valoriza a coletividade em detrimento do indivíduo e exige dos
homens o cumprimento de normas de conduta que garantam a ordem. À luz dessa
teoria se deu o nascimento da república brasileira, o que, apesar de remoto,
produz reflexos da aplicação da filosofia positivista ainda na
contemporaneidade brasileira.
Caracterizadas
por uma gestão compartilhada entre a Secretaria de Educação e a de Segurança
Pública, as escolas cívico-militares são a mais clara expressão da doutrina
positivista no Brasil. Com a administração pedagógica sob responsabilidade de
pedagogos e a gestão de conduta sob os militares e profissionais de segurança,
essa modalidade de ensino preza pela moral e pela ordem e, por conseguinte,
geram no imaginário popular a ideia de um ambiente seguro e disciplinado. Entretanto,
o que se observa nesse ambiente é a banalização das normas de conduta e do que
seria “indispensável” para o bom funcionamento da sociedade, uma vez que são
exigidas posturas inadequadas e até mesmo desnecessárias. Dessa maneira, está
presente a valorização de um comportamento passivo diante das exigências – em
conformidade com a teoria positivista de observação dos fatos –, o que
corrobora para a ausência de um pensamento crítico dos indivíduos, um
cumprimento de normas irrefletido – seguir regras pelo simples fato de
segui-las – e, principalmente, a aceitação de punições severas e inaceitáveis
com a justificativa de manutenção da disciplina.
Em
suma, o enaltecimento do positivismo vai muito além do pretexto de garantia do
equilíbrio social, pois, mesmo que de forma velada e desconhecida pela opinião
popular, essa doutrina é responsável por disseminar a submissão e a conformação
coletiva diante dos problemas da sociedade, das posições sociais e da
reinvindicação de direitos. A busca pelo bem-estar comum não deve pautar-se em
uma moral que oprime debates e isenta práticas violentas, mas sim na
insatisfação e no questionamento das condições sociais, em um posicionamento
ativo e distante da mera observação dos parnasianos e positivistas.
Giovanna
Cardozo Silva - Turma XXXVIII - matutino
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