CESSÃO ÀS PRESSÕES SOCIAIS E A DESFORMALIZAÇÃO DO DIREITO
A decisão do Superior Tribunal Federal de descriminalizar
o aborto de anencéfalo representou a atenção ao desejo de uma classe social
específica. A ação e processo movido em favor da descriminalização da temática
em questão partiu de médicos obstetras que foram indiciados por prática de
aborto. A questão central neste cenário reside no fato de que a expectativa de
vida dos fetos em situação de anencefalia era mínima, pífia ou inexistente, o
que levava muitas gestantes a recorrerem ao aborto, ainda que de forma ilegal,
o que implicava em prática criminosa por parte dos médicos que se submetiam ao
exercício do procedimento.
Bourdieu sinaliza
que o direito não pode ser instrumentalizado em favor de uma classe, o que é evidente
em tal situação. Porém o autor não se atenta aos motivos pelos quais levaram
dois grupos, de maneira geral (médicos e gestantes), a recorrerem ao STF como
forma de amenizar uma problemática recorrente.
Outra questão que
infringe preceitos descritos por Bourdieu está associado à interpretação das
leis. O julgado apresenta votos de ministros que foram favoráveis à descriminalização,
dos quais abordaram aspectos dos direitos fundamentais. A argumentação partiu da
ponderação dos direitos de vida e liberdade, e feriu a hermenêutica jurídica de
forma que a interpretação para com a norma jurídica e os preceitos da Constituição
Federal foram contaminados por valores morais e éticos de uma profissão que
justificadamente não tem o direito de dizer o Direito. Em suma, os votos
favoráveis mostraram-se amplamente influenciados pelos valores da medicina, que
ainda que seja necessário considerar alguns conceitos formulados pela ciência
biológica como o conceito de vida e/ou interrupção da vida, não podem
interferir no exercício do direito puro, que se abstém de valores de outras áreas.
Quando se permite que outras interpretações das normas jurídicas sejam efetivadas
garantindo que possam inferir na alteração do ordenamento, depreende-se que as
decisões judiciais deverão muito mais aos valores morais e éticos do agente do
que ao exercício pleno do direito.
Em contraposição a
este fator, deve-se evitar o formalismo, em que o Direito se estabelece como
formador próprio. É imprescindível considerar que o Direito é influenciado
pelas mudanças sociais, logo as pressões sociais ao longo do tempo são responsáveis
por inferir diretamente nas alterações do ordenamento vigente, como ocorreu com
a ADPF-54.
- Jonathan Toshio Maciel da Silva (1° Noturno)
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