Total de visualizações de página (desde out/2009)

domingo, 18 de agosto de 2019

Bourdieu e as questões do Direito Contemporâneo


Influenciado por Foucault, Weber, Durkheim e diversos outros sociólogos, Pierre Bourdieu (1930-2002) foi um sociólogo francês que tratou acerca da constituição do campo jurídico. O poder e influência do Direito sobre a sociedade, também foi matéria importante no pensamento de Bourdieu, que o conceituava como uma dinâmica que engendra a “lógica positiva da ciência” e a “lógica normativa da moral”, num sistema somatório, o que tornava a mesma, complexa.
Para o sociólogo, o Direito possui uma autonomia relativa, já que não se trata apenas de defender puramente a aplicação das normas como o faz Kelsen, tornando-o formalista; e também deve evitar o instrumentalismo, pois, sendo algo que exerce poder sobre o corpo societário, não se pode permitir que fique exclusivamente a serviço das classes dominantes.
Outro fator importante dentro do campo jurídico, apontado pelo autor, é a questão da interpretação e de quem as faz: doutrinadores e operadores. Esses “intérpretes”, de certa forma também representam uma limitação ao campo, já que a interpretação possui influência das posições ocupadas por eles e do habitus de cada um, ou seja, a vivência e a ótica dos intérpretes acerca do mundo, o que se vincula à dinâmica da “luta simbólica”.
O sociólogo também aponta as expressões da racionalização, que seriam os efeitos de neutralização e de universalização dentro da linguagem jurídica. A primeira caracteriza-se pela construção passiva e frases impessoais de sintaxe, e a segunda, pela sistematização de enunciação de normas.
Sendo assim, ao analisar a ADPF 54 que trata acerca da antecipação terapêutica de fetos anencéfalos, sob a ótica de Bourdieu, levou-se em conta que o Direito deve ter em sua ontologia o misto de racionalidade com o poder moral. A linguagem utilizada no documento gerou os dois efeitos supracitados, já que a relatoria construiu os argumentos com bases científicas, com apontamentos da medicina, e também históricas, como o fator da laicidade do Estado.
Ao analisarem normas já positivadas e tentarem encontrar a forma mais “justa” para decidir a situação, é possível ver uma atitude relacionada com o conceito de “historicidade da norma”, que seria a aplicação da norma no contexto da realidade social vivida naquele momento.
Ademais, a cientificidade da medicina, com o conceito de anencefalia pela biologia, aliada ao poder moral, representada pela preocupação com a saúde física, psíquica e a questão emocional envolvendo não apenas àquela que carregava o feto, mas também todos da família, apresentou um grande exemplo da aplicabilidade do conceito de Direito de Bourdieu.
A dignidade da pessoa humana da grávida também foi suscitada, levando à reflexão acerca do poder simbólico do Estado que, através do Direito, exerce sua soberania e pode efetivar a opressão contra à mulher e ao seu direito de escolha, de forma legitimada.
 Através do exposto, é possível concluir que a aplicação dos conceitos de Bourdieu no Direito Contemporâneo, e sua forma de ver essa matéria podem auxiliar na maneira dos intérpretes, e daqueles aptos a “manusearem” o Direito, a enxergarem esse poder de outra forma, permitindo assim, que se realizem grandes transformações sociais. Destarte, será possível enxergar uma via em que o Direito será emancipador.  


Daiana Li Zhao
Direito Matutino - 1º ano 

Nenhum comentário:

Postar um comentário