Bourdieu foi
um importante sociólogo francês do século XX, que, em um dos capítulos do seu
livro “O Poder Simbólico”, tratou sobre o campo jurídico, seu poder simbólico e
o modo como ele se estrutura.
Alguns pontos
centrais de sua análise sobre o direito são a sua autonomia relativa, a sua
lógica duplamente determinada, os chamados “espaços dos possíveis” e a relação das
forças internas do campo, além do conceito de habitus e do poder simbólico da linguagem utilizada. No julgado
sobre a interrupção terapêutica no caso de feto anencéfalos, podemos observar
todos esses pontos da análise de Bourdieu.
Apesar do
direito ser um sistema autônomo, ele depende de outros campos da sociedade; por
isso sua autonomia é relativa. Isso pode ser observado quando a opinião dos amigus curi é levada em consideração na
decisão do caso. Essa acaba sendo embasada dentro dos campos da medicina, da
moral, da ética e da religião; ou seja, todos os tipos de capital são levados
em conta para a decisão.
Além disso,
temos a lógica duplamente determinada. Apesar de haver confronto tanto entre
argumentos quanto até mesmo entre normas e seus métodos de interpretação, há
uma hierarquia entre eles, como é o caso da prevalência da Constituição e de
Tratados Internacionais ratificados sobre as demais leis, o que têm como
consequência a própria estruturação do direito. Ou seja, apesar de ter-se no
direito o confronto de diversas forças, há uma hierarquia pré-determinada. E a
relação entre ambos delimita o chamado “espaços dos possíveis” no qual a
decisão sobre determinado caso deverá ser tomada.
Na ADPF 54,
temos o confronto entre diversas leis da Constituição e de Tratados
Internacionais em relação ao Código Penal, o que levou ao questionamento se a
aplicação do Código Penal ao caso é ou não inconstitucional. Dentro do “espaços
dos possíveis”, observou-se que sim, nesses casos, a aplicação do Código Penal
é inconstitucional, devido ao feto ser um natimorto cerebral. Ou seja, devido
às leis constitucionais estarem “acima” das leis penais, tem-se que o aborto de
fetos anencefálicos é legal juridicamente.
Ademais,
observamos também que o habitus de
cada ministro interfere muito no seu voto e a linguagem utilizada por cada um
também reflete isso. Aqueles que são contra a decisão, referem-se a ação como “aborto”,
muitas vezes associando-o à palavra “eugenia”, já aqueles que são a favor
referem-se como “interrupção terapêutica da gravidez” e “antecipação
terapêutica”.
Bianca Garbeloto Tafarelo - 1º ano Direito Matutino
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