Algum
lugar, 14 de agosto
Caro amigo Libitino
Diligeu,
Começo minha carta agradecendo-vos! Em verdade, não
repartistes os louros do Discidt
comigo, mas, por conseguinte, também não repartistes a vergonha de, na
tentativa de maximizar a lógica positiva, ter, a partir do positivismo, criado
sua própria cova.
Para que entendais minha resignação, tens, primeiro,
que entender os motivos pelos quais, em tão longínquos tempos, cheguei a
conclusão de que a ciência era o
único instrumento de desenvolvimento humano: o contexto histórico em que vivi foi marcado por "anarquias" e
"desordem", regimes despóticos e revoluções. Tais acontecimentos
levaram meus contemporâneos a uma insatisfação com a política em geral, chegando
a beirar a descrença. Tinha-se, então, uma crise de valore.
Daí origina-se minha ideia de que as anomalias
deveriam ser eliminadas e, consequentemente, eliminar-se-ia também a desordem
e, dessa forma, a sociedade poderia livremente caminhar para o progresso.
Entretanto, ao longo dos séculos, conversando com
pessoas com crenças diferentes, percebi que é justamente na desordem que se
atinge o ápice do desenvolvimento. A contraposição de ideais, perspectivas e
realidades força o ser humano ao seu limite. Força-o a se questionar se aquilo
que acredita é realmente correto, força-o a investigar, força-o a progredir.
Minha teoria, jovem aprendiz, não fora ao todo inútil.
Apesar de ter falhado em vários pontos, por um jogo de interesses regido pela ganância
e o egoísmo, observo que, ainda no seu tempo, minha sociologia é adotada como
um dos principais pilares do corpo social. A sociedade industrial, ainda sim, é
muito ligada à ideia de que o único conhecimento válido é o científico e o
único desenvolvimento válido é o tecnológico. Assim sendo, vai-se rotulando
certos grupos e comportamento como anormais, forçando-os a se encaixarem nos padrões,
evitando conflitos...
Sinto muito não poder ajudar-vos. O trabalho de nossas
vidas, resulta, no final das contas, em uma grande inverdade. Inverdade essa
que, ironicamente, é a base do tão avançado e científico pensamento
positivista.
Atenciosamente,
Augusto
Comte
Gabriel Chiusoli Ruscito - Direito 1° ano, noturno
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