Somos menos que
os bois de Guimarães Rosa e nos equiparamos aos mesmos de Drummond.
A dinâmica da
família estava assentada na rua e a vida das crianças no raio de seus pais. São
três os filhos que guardam os instrumentos, enquanto, do outro lado do
entroncamento entre as duas avenidas, a mãe estende na calçada seu pano em que
expõe as artes feitas à mão e à hora. Diante das crianças, o pai, que se reveza
entre as clavas e os arcos frente ao semáforo, apresenta, em menos de 45
segundos, seus malabares a uma fila compassada de automóveis enclausurados em
seus “lugares sociais”.
A dinâmica das
ruas, assim como a do positivismo, prevê a linearidade, plenificação no uso da
razão para que não se finde o caos entre os automóveis que as utilizam e o
balanceamento entre o estático e o dinâmico a fim de amalgamar a aptidão do
agir e a realização da própria ação efetiva – respeito às sinalizações, aos
semáforos, à hora de parar e de prosseguir, às noções de espaço -. Nesse caso,
adornados de suas identidades de “lugares sociais”, as figuras sociais que
conduzem os automóveis, em seus caminhos positivados, ao se depararem com um
núcleo familiar sistematizado na intempérie das ruas e sobrevivendo da própria
arte, é acometida pelo espanto positivista – consumado pela naturalização da
lógica e das diretrizes dominantes dentro de uma sociedade – e que, nas
palavras de Comte, faz-se como “[...] a sensação mais terrível que podemos
sentir aquela que se produz todas as vezes que um fenômeno nos parece ocorrer
de modo contraditório às leis naturais, que nos são familiares.”
Nesse sentido,
ao introduzir a prática rural da atividade dos gados literatos em relação ao
comportamento humano salteado pelo espanto comtiano, pretendia-se evocar a similaridade
dessa atividade com a positividade compassada de carros e da abstenção moral de
seus condutores diante de uma situação que, numa visão positivista própria,
prevê a desordem e a disfunção social. Somos menos que os bois de Guimarães
Rosa em “Conversa de Bois” uma vez que, ao assimilarem os processos mentais dos
homens, subvertem-se à ordem e agem a fim de romper os grilhões que
limitam suas ações a praticar algo que não contemple seu status. Equiparamo-nos
com os bois de Drummond em “Um boi vê os homens” a medida em que corremos
perdidos, desprovidos de essência tenaz e, dessa forma, mostramo-nos “espantosamente
graves e sinistros”, blindamo-nos daquilo “[...] que é visível/e comum a cada
um de nós, no espaço.”. Ruminamos uma verdade germinada por uma ciência viciada
e abastada das realidades e necessidades sociais.
Leonardo Henrique de Oliveira Castigioni
1º Ano Direito - Noturno
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