A organização da sociedade se pauta na estruturação de conceitos e valores, que são os aspectos básicos na garantia da ordem, da coesão e, dessa maneira, da sobrevivência da coletividade. O particular não pode se desvincular totalmente do que é geral. O convívio pressupõe isto, todos devem pautar seus atos segundo noções básicas e comuns para que as relações sociais,a comunicação entre as partes, seja possível.
Nessa esfera de noções básicas ou comuns ao todo, se insere o conceito de justiça, que assim como os demais passa por um constante processo de mutação. O que ocorre é que à medida que a humanidade se desenvolve, atravessa os séculos e expande seus olhares sobre o mundo, ela se transforma, agrega novos valores, novas concepções. E arrasta consigo os conceitos formados, cuja metamorfose acompanha a linha do tempo.
E se a conceituação muda, a dinâmica concreta desses valores também se transforma. Aproveitemo-nos da divisão feita por Durkheim para ilustrarmos esta questão, contrapondo as sociedades primitivas às atuais, ou complexas. Nas primeiras os valores garantidores da coesão a que me referi inicialmente são mais rígidos, e não só eles. A exigência do cumprimento destes também. Assim, a ordem nas sociedades primitivas é permeada pelo direito repressivo, que busca combater e punir cada regressão da estrutura moral, já que a sobrevivência do corpo social depende diretamente da padronização de comportamentos.
Com a complexibilização da sociedade, essa necessidade desaparece e o corpo social se heterogeiniza. O padrão passa a ser não só um, mas vários. E os valores se flexibilizam, multiplicam e pluralizam. Em meio a isso, o direito restitutivo sobrepõe-se ao repressivo.
Nesse contexto, há maior abertura à interpretações individuais dos fatores sociais. E o cumprimento ou efetivação dos conceitos perde sua rigidez. Voltemos então à questão da justiça, intimamente ligada ao Direito. Diante da estrutura social mais complexa e burocratizada, do afrouxamento dos elos valorativos, o Direito restitutivo se estabelece na atualidade com a seguinte matemática: “alguma justiça é melhor que nenhuma”. Essa é a linha da mediocridade, do contentar-se com pouco. Essa é a linha que, infelizmente, está se alastrando pela realidade atual. Essa é a linha que barra o progresso.
Pensar que “alguma justiça é melhor que nenhuma” é fazer um pouco e achar que basta, é ignorar o resto. Diante de situações muito ruins, o pouco que se faz é aplaudido, satisfaz. E pronto. O resto é esquecido. Não se busca mais. Com essa mentalidade a noção de igualdade sobre a qual o conceito de Justiça se sustenta, se perde. Igualdade não é ver a parte, é ver o todo. Fazer para um ou alguns não é fazer para todos. O melhor não é alguma justiça, mas a justiça plena. Utópico? Antes a busca incessante pelo “inalcançável” que o triste contentamento com a mediocridade.
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