Richard Sennet, em sua
obra intitulada “A Corrosão do Caráter: Consequências Pessoais do Trabalho no
Novo Capitalismo” analisa a sociedade de seu tempo, do fim do século XX,
sob o prisma do materialismo histórico dialético: ao desvendar a lógica
produtiva imperante entre os indivíduos, torna-se capaz de apontar como estes
se relacionavam, a forma através da qual pensavam e quais eram as motivações de
suas ações cotidianas. Nesse sentido, Sennet revela como o ideal do “capitalismo
impaciente”, que urge uma vida direcionada à “acumulação flexível”, como elenca
David Harvey, também se manifesta no cotidiano pessoal dos indivíduos inseridos
nesse sistema produtivo.
Embora essa análise seja referente ao fim do século
XX, a sociedade atual não se mostra muito diferente da qual era outrora
dominada pelo “capitalismo impaciente”. A organização produtiva neoliberal, que
domina o pensamento econômico, torna-se capaz de transformar tudo numa
constante busca pelo “aperfeiçoamento profissional”, de modo que nenhuma
oportunidade deve ser desperdiçada. Dessa forma, mesmo em tempos pandêmicos,
por exemplo, ficou comum a disponibilização de cursos online para que as pessoas pudessem se “desenvolver
profissionalmente” enquanto ficavam em suas casas, como se fosse possível
classificar qualitativamente o aproveitamento da quarentena pelos indivíduos.
Como consequência a esse pensamento ultracompetitivo, até
mesmo as coisas mais banais da vida têm seu preço: hoje é possível encontrar,
por exemplo, fones que são capazes de isolar o som ambiente para os indivíduos
que buscam um pouco de silêncio. Fica evidente, portanto, a capacidade do
sistema capitalista em alterar a relação do homem com a natureza, e como a
partir de tal alteração, de modo surpreendente e assustador, o próprio capitalismo
encontra formas de lucrar.
Por fim, como é atestado por Marx e Engels já no século
XIX, nada do mundo fático fica ileso à forma pela qual os indivíduos organizam
seus meios de produção material e de vida. Nesse sentido, nem mesmo a religião
atualmente se mostra capaz de “fugir” desse capitalismo imperante e exacerbado:
há cerca de uma semana houve a divulgação de uma suposta lavagem de dinheiro
envolvendo a construção de uma das maiores basílicas do Brasil, sob a
administração da Afipe, que chegou a movimentar cerca de 2 bilhões de reais(1).
Portanto, é através do materialismo histórico dialético, elencado por Marx e Engels e utilizado por Sennet em sua análise social, que se torna possível observar as diversas manifestações do neoliberalismo no cotidiano atual dos indivíduos, marcado pela competição incessante e pela alteração do natural, e do qual nem mesmo a religião sai ilesa.
(1). Reportagem sobre suposta lavagem de dinheiro envolvendo a construção da Basílica: https://g1.globo.com/go/goias/noticia/2020/08/24/padre-robson-diz-que-nova-basilica-de-trindade-deve-custar-r-14-bilhao-apos-previsao-inicial-de-r-100-milhoes-nao-e-barato.ghtml
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