Durante a Revolução Industrial do século XIX, surgiu no âmbito social uma nova estratificação da sociedade- proletariado e burguesia- além do fenômeno do êxodo rural. Imersos nesse novo panorama, Karl Marx e Friedrich Engels, teóricos revolucionários, escreveram a obra “Ideologia Alemã”, cujo objetivo não era simplesmente interpretar a realidade de várias maneiras, mas sim transformá-la. Entre outras teorias, foi desenvolvida a do materialismo histórico dialético, baseada no fato de a vida social ser um reflexo das relações de produção. Consequentemente, uma alteração nas relações de produção na modernidade, afetaria a organização dos indivíduos. De fato, embora o processo de globalização tenha se iniciado no século XV, a globalização de orientação neoliberal, que ocorreu entre o fim dos anos de 1970 e início de 1980, resultou em uma drástica mudança no quesito da produtividade e, logo, na sociedade e em sua principal forma de ser regulada, o Direito.
A globalização é caracterizada pela profunda integração e interdependência econômica, social e política entre as nações. Seu principal objetivo é obter a maior lucratividade possível no menor espaço de tempo. Para isso, a relação de produção se alterou profundamente: somados aos processos ágeis, a submissão ao novo ritmo e rápidas mudanças é exigida aos trabalhadores e, caso esses não sejam aptos a tais exigências, são imediatamente descartados e substituídos. Percebe-se, nesse ínterim, que a agilidade e flexibilidade compõem as novas relações de produção e, consequentemente, a coordenação da vida social que, a partir desse instante, será regida por uma ordem em que o indivíduo está, a todo momento, sob o risco da, segundo Sennet, “catástrofe iminente” de ser substituído. Na teoria, o Direito, a partir de legislações sociais e trabalhistas, deveria proteger o trabalhador de inseguranças no ambiente de trabalho, a fim de garantir a proteção de sua dignidade. Porém, com o advento da política neoliberal, é avançada a prática do “Estado Mínimo”, na qual o Estado intervém em grau mínimo nos setores essenciais, concedendo maior poder às empresas privadas, cujo principal objetivo é a máxima lucratividade, explorando o trabalhador e o colocando em situação de risco, caso não se submeta aos processos ágeis exigidos. Com tal tendência à concentração de poder nos setores privados, surgem várias reformas sociais e econômicas, como a trabalhista e previdenciária, que legitimam a condição instável do trabalhador. Assim, não só a vida dos indivíduos foi alterada como as regras que os conduzem, visto que o Direito se enfraqueceu na medida em que foi subordinado à lógica do capitalismo flexível.
Sob uma perspectiva mais interna, é notória no Brasil a submissão do Direito ao capitalismo flexível nas recentes reformas ocorridas no governo do presidente Jair Bolsonaro. Por exemplo, em outubro de 2019, foi aprovada a PEC 6/2019, reforma previdenciária que fixou a idade mínima para aposentadoria (65 anos para homens e 62 anos para mulheres), além de um novo cálculo para se chegar ao valor que a pessoa receberá ao aposentar. Segundo Denise Gentil, professora da UFRJ, o tempo determinado é um período que muitos não conseguem completar, além de dizer que a reforma diminui os salários, gerando um aumento da pobreza. Logo, vê-se que a reforma no âmbito jurídico favorece a lógica capitalista na medida em que empobrece o trabalhador e favorece as empresas privadas.
Outra característica do capitalismo flexível se encontra na expansão das empresas transnacionais, na qual a sede se localiza normalmente em países desenvolvidos e as filiais em subdesenvolvidos, havendo uma divisão do trabalho em escala global. Essa lógica se baseia no fato de gerar mais capital para as empresas, devido à menor pressão sindical e mão de obra mais barata nos países subdesenvolvidos, onde se localiza a produção. Tais condições mais favoráveis financeiramente para a produção ocorrem devido ao fortalecimento político das corporações em relação ao Direito dos Estados Nacionais, haja vista que os países subdesenvolvidos tentam adequar suas legislações aos critérios exigidos pelas empresas, para gerar mais empregos para sua população, mesmo que isso implique em flexibilizar sua regulamentação trabalhista. Assim, novamente, os trabalhadores que não conseguirem se adaptar às exigências do capitalismo flexível, estão cada vez mais suscetíveis ao desamparo legal e risco de perder seu emprego, caso não siga as exigências das empresas transnacionais.
Portanto, é indubitável que a Marx e Engels estavam corretos ao definir
que o meio de produção condiciona a vida social. Com a lógica do capitalismo
flexível baseado na agilidade e flexibilidade, tais características também
passaram a definir o modo com que o homem deve agir, estando suscetíveis continuamente
ao risco de substituição. Tal risco aumentou a partir do momento em que o meio
de produção da globalização passou a reger, também, o Direito, fazendo com que
legislações trabalhistas e sociais favorecessem a condição instável do
trabalhador em seu emprego e o acúmulo de capital nas empresas privadas e
transnacionais. Isso é evidenciado nos meios nacionais e internacionais, como
visto previamente, com um único objetivo: máxima lucratividade,
independentemente dos direitos sociais do trabalhador.
Ana Marcela Nahas Cardili- 1° ano Direito Matutino
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