A propriedade é um direito que alguns têm, uns
em abundância. A concentração de terras é comum no Brasil, e, muitas vezes,
esses grandes latifúndios que deveriam cumprir sua função social, de acordo com
a Constituição de 1988, não o fazem. O Estado, teoricamente, deveria fiscalizar
essas propriedades e penalizar as que não estão de acordo com a Constituição,
porém, isso pouco ocorre.
Por isso, o grupo MST ocupa as terras com
problemas legais, que não cumprem sua função social e que tenham um outro problema
de cartório ou IPTU não pago. Apenas a falta da função social não basta, pois,
conforme diz Boaventura de Sousa Santos, o direito é polarizado, focado em um
direito configurativo, ou seja, que reflete as configurações de poder. Esse
poder sendo composto pela bancada ruralista, que apoia a concentração de
terras.
O direito brasileiro apresenta relações de
poder muito desiguais, pois certas pessoas têm maior capacidade de manipular o
direito (como as que compõe o poder), e outras não. O que causa um desequilíbrio,
fazendo com que o direito brasileiro se divida entre os 1% (elite) e os 99%
(maioria prejudicada).
O MST faz parte dos 99% e apresenta um caráter
de indignação, resultado da desigualdade social e da polarização do direito.
Eles lutam por melhores condições de vida, principalmente por um lugar para
morar. Então eles tentam algo que o Boaventura chama de “mobilização jurídica
proativa”, ou seja, eles mobilizam o judiciário de forma que suas necessidades
sejam garantidas. Conseguindo pressionar o Judiciário, o MST fez uma iminência
de transformar a sociedade, transformando o direito configurativo em direito
prefigurativo.
Na decisão da Fazenda Primavera, o MST
conseguiu o direito prefigurativo, pois o Judiciário decidiu que aquele terreno
não estava cumprindo com suas obrigações constitucionais, assim, cedendo-a para
o MST. Os proprietários não deixavam que o INCRA fizesse vistorias, então não
se sabe para o que a propriedade servia, porém, como o INCRA era impedido de
entrar, toma-se como pressuposto que a terra não cumpria com sua função social.
Portanto, vitória do MST mostra que o direito
pode ser a esperança contra a hegemonia, contra o 1%, evidenciando a
possibilidade de alcançar a emancipação através dele. Porém, a vitória concreta
dos 99% sobre o 1% só será efetivada quando o direito deixar de ser
configurativo, ou até mesmo prefigurativo, virando um direito reconfigurativo,
ou seja, um direito usado contra a hegemonia, em uma sociedade já mudada.
Daniela Alves Ribeiro - Direito Matutino
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