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domingo, 1 de julho de 2018

Direito reconfigurativo e os movimentos sociais


Segundo Boaventura de Sousa Santos, na contemporaneidade, o direito e o sistema judicial são utilizados para regulamentar e promover sistemas politicamente democráticos, mas socialmente injustos. Com a tutela feita aos grupos de elite, os 1% da população, o direito acaba atuando em uma perspectiva abissal, onde o restante do contingente populacional, os 99%, vê suas garantias gradativamente deixadas de lado.
Tal fato se corrobora no fascismo social, um fenômeno caracterizado pela dominação de um grupo social sobre o outro. Apoiando-se no fator de regulação do direito, a sociedade se torna cada vez mais excludente e seletiva, atendendo os interesses apenas daqueles que possuem destaque. No entanto, tal situação pode ser alterada com a atuação dos movimentos sociais contra hegemônicos, que buscam ocupar o direito com suas demandas, fazendo-o assumir seu caráter emancipatório.
A busca pelo acesso e distribuição igualitária da terra sempre foi um assunto recorrente no Brasil. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) surgiu em 1984 e desde então vem lutando de maneira contra hegemônica, buscando reconfigurar as relações de poder, estabelecer garantias e ocupar o direito com suas demandas. Durante tantos anos de lutas e de estratégias para a realização de uma reforma agrária, o movimento conseguiu alguns feitos importantes. Um deles foi o caso da Fazenda Primavera, que foi entregue aos ocupantes depois da tentativa de reintegração de posse.
Esse feito só foi possível devido a mobilização do direito em uma perspectiva reconfigurativa, como defende o sociólogo, uma vez que os manifestantes, provenientes do grupo dominado, ocuparam o direito com suas pautas e demandas, mudando a hegemonia e influência dos grupos no poder nas decisões jurídicas. Dessa forma, pautando-se por elementos como a função social da propriedade e o artigo 6º da Constituição Federal, que garante o direito à moradia, os ocupantes permaneceram no lugar em que estavam.
Destarte, a liminar favorável aos movimentos sociais demostrou que a perspectiva do direito abissal pode ser modificada e que o ordenamento jurídico pode ser ocupado pelas demandas dos movimentos contra hegemônicos se aplicados de uma maneira reconfigurativa. No entanto, Boaventura, mesmo acreditando no potencial das pressões sociais, defende que as mudanças só se realizarão de maneira efetiva se uma reforma no sistema democrático acontecer, com o estabelecimento de uma democracia real pautada na igualdade de fato em todas as esferas da vida social.

Jéssica Castor Modolo – Direito Matutino

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