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segunda-feira, 22 de outubro de 2012


AS COTAS NAS UNIVERSIDADES COMO EXPRESSÃO DO EMBATE DIALÉTICO ENTRE OS INTERESSES DIVERSOS NO DIREITO NATURAL MATERIAL




O processo de transição do Direito natural formal para o Direito natural material encontra-se como característica fundamental no âmbito das questões filosóficas referentes ao Direito na atualidade. Se Weber previu o gradual, contínuo e eventual enfraquecimento da racionalidade absoluta no mundo jurídico, talvez, Weber não teria imaginado a centralidade da questão em tempos pós-modernos. O Direito, ainda em processo de transição do natural formal para o natural material, é cada vez mais utilizado no sentido de se instrumentalizar a busca por direitos das minorias, ao mesmo tempo, que dele também se utiliza no intuito de garantir o status quo. Enquanto as minorias, no caso brasileiro, buscam a ação emancipatória do mundo jurídico como os americanos excluídos faziam na década de 60; as forças reacionárias se apoderam do aparato jurídico para barrar qualquer transformação significativa sob a máscara das justificativas constitucionais. Assim, o Direito adquire caráter cada vez mais material, influenciado por forças de todos os tipos, origens e aspirações; onde o resultado da luta quase dialética de forças antagônicas transforma o jurista, o operador do Direito, em um ser cada vez mais social, onde há a pressão da lógica e da racionalidade e o olhar coletivo para pressionar a favor da plena efetivação do Direito.

O embate entre interesses materiais intrinsecamente ligados ao Direito se expressa sob vários prismas diferentes. Aborto, direitos homoafetivos, questões raciais, ações afirmativas relativas à educação, todos são temas polêmicos onde o conflito jurídico entre a luta de classes opostas emerge claro, coeso e abrangente.  E no caso das cotas para o ensino superior público, o debate e o confronto ideológico não poderiam ser mais evidentes. Não poderia ser mais evidente porque a lei sancionada recentemente que aloca 50% das vagas nas universidades federais para estudantes de universidades públicas, é fruto inquestionável de um processo social externo, ou seja, surge como resposta estatal à demanda social e não o contrário. Demanda fortalecida desde a promulgação da Constituição de 1988 quando foi garantido, a todos os brasileiros, o voto universal, secreto, direto e periódico. 

Após a inclusão política, deu-se a inclusão econômica graças à estabilidade proporcionada pelo controle da inflação, ao novo poder de compra introduzido pelo real em 1994. A massa, assim, com direitos políticos e ascensão econômica crescente, passou, então, a reinvidicar mais, a desejar mais, a buscar por mais. Em sua maioria, negra e parda, a massa, chamada de classe E, D e C, passou, então, a acreditar no poder emancipatório do Direito.  Com a eleição do governo Lula e a criação de inúmeros programas sociais, veio a vez da educação. Se os níveis de desigualdade social caíram no país, as ambições caminham em sentido contrário. Ao invés da polarização política, da luta armada ou do questionamento da ordem estabelecida, as minorias fizeram uso do Direito como fator de pressão social. O Direito, consequentemente, assumiu seu papel cada vez mais material no sentido que é preenchido por vozes moderadas, por interesses diversos e por aqueles que passaram a enxergar nele não somente como expressão conservadora, mas como força progressista.

Por outro lado, à medida que o Direito caminha a passos largos rumo à materialidade, ocorre processo inverso, processo de força de reação sob justificativas variadas, mas de acordo com prinícipos comuns. Isso porque se o Direito transformou-se em ferramenta emancipadora, ele também adquiriu caráter de mecanismo conservador. Conservador, pois, sob pretextos constitucionais que alegam preconceito inverso e inconstitucionalidade ao prover direitos e garantias às minorias em “desfavor” da maioria e do bem comum, dá-se a luta pelos “direitos da maioria esquecida”. Assim, o lugar do Direito na esfera do material parece cada vez mais certo e estabelecido; materialidade tal que sugere o resultado dialético de forças progressistas e conservadoras como influência preponderante sob o exercício e função da atividade judiciária e do Direito.

O operador, o teórico, o pensador do Direito não se fecha mais nos confins do mundo jurídico. Ele é, agora, ser material; existe perante às doutrinas, às leis, aos costumes, mas também perante aos olhos atentos dos ombudsman sociais: fiscais imperdoáveis que buscam a todo e qualquer momento a defesa, a luta e proteção de interesses particulares difusos frente à debilidade crescente do racionalismo total, do legalismo romântico e do raciocínío estritamente lógico em contextos jurídicos. Por isso, é improvável sugerir a resolução da questão das cotas; ganharão as minorias historicamente esquecidas e suas aspirações ou o establishment econômico e político ligados às elites e classes médias conservadoras? 



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