É indubitável o contexto de retrocesso
vigente na sociedade pós-moderna no que tange à ciência: ao passo que filósofos
do século 17 como o francês René Descartes e o britânico Francis Bacon
postulavam fundamentos necessários para a construção do pensamento científico
tal como este é conhecido, presencia-se, na atualidade, a ascensão de
movimentos que questionam a confiabilidade expressada pela ciência e seus
instrumentos. Posto esse cenário, torna-se vital a busca pela origem dessas
indagações que colocam em risco o avanço da produção de conhecimento.
Encontra-se, então, o diálogo exercido entre o saber e o poder – de tal modo
que se compreende a estrutura do obscurantismo intelectual contemporâneo sob a
perspectiva de que a nossa razão motriz é a busca pelo controle do meio.
Paralelamente
ao terceiro aforismo de Francis Bacon em “Novum Organum”, que afirmava que
“Ciência e poder do homem coincidem”, Michel Foucault, em sua obra “Vigiar e
Punir”, de 1975, diz que “O poder produz saber (...), não há relação de poder
sem constituição correlata de um campo de saber, nem saber que não suponha e
não constitua ao mesmo tempo relações de poder”. Sob esse viés, é notável que a
produção do conhecimento científico na atualidade volta-se à consolidação da estrutura
social de poder e opressão. Isso é decorrente do fato de que a ciência cria
custos e demanda investimentos, o que a torna refém daqueles que podem pagar
por ela. A exemplo de tal condição, pode-se mencionar a indústria farmacêutica,
cuja ciência, necessária para as condições de saúde humana, é comercializada em
prol do rendimento de lucros à uma conjuntura econômica capitalista. Ademais,
situa-se em uma condição semelhante de rendição a indústria bélica – para qual
a ciência atua em favorecimento da destruição através de embates armados e
abastece entidades militares em conflitos geopolíticos, favorecendo aqueles
grupos que podem financiá-la.
Diante o cenário
supramencionado, cabe ressaltar a maneira com a qual o distanciamento entre a
Academia e a grande parte da população colabora na solidificação dos movimentos
de anticientificismo. Seja devido à linguagem rebuscada ou por uma dificuldade
de acesso à compressão da produção científica, é indubitável que, na
modernidade, a ciência está cada vez mais restrita em uma bolha. Enquanto a
sociedade apenas se depara com as conclusões dos experimentos e não com os
processos e as pesquisas utilizadas para que se alcançasse tal veredito,
torna-se popular o questionamento à metodologia e aos instrumentos aplicados. Inflamados
pela rapidez da velocidade das informações nas mídias digitais, coletivos
contrários à ciência como conhecida passam a ganhar popularidade justamente por
dialogarem de maneira horizontal com a população que não está inserida no meio
científico. Portanto, embora as constatações dos grupos anticientíficos sejam
falaciosas, é relevante que essas ideias não somente sejam desconstruídas, mas
também que a origem dessa linha de raciocínio seja avaliada e revertida –
reduzindo a distância entre a ciência e o corpo social.
Assim,
entende-se que, embora a discussão no século 17 fosse a construção de um método
científico eficaz e confiável, é necessário, no século 21, o debate sobre como
mantê-lo, aprimorá-lo e democratizá-lo. Manter o conhecimento restrito a poucos
e formulá-lo à luz do interesse do topo da pirâmide social é um comportamento
nocivo à própria vitalidade do conhecimento científico, pois torna-o passível
da dúvida e do questionamento por parte dos demais. Com efeito, embates como o
travado por Bacon e Descartes - considerados pais da ciência moderna - em
defesa da racionalidade na produção do conhecimento emergem na sociedade contemporânea
e tornam-se cada vez mais atemporais - uma vez que a proteção à gnose deve ser
contínua e, sobretudo, efetiva.
Giovanna Spineli de Paiva - Noturno (1º ano)
Parabéns, Giovanna. Excelente.
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