O
agravo de instrumento a respeito de reintegração de posse chegou ao Tribunal
Regional do Rio Grande do Sul no ano de 2001. O processo teve como relator o
desembargador Carlos Rafael dos Santos Junior, e teve como resultado a não
reintegração de posse.
Sara Araújo
traz a noção de um Direito eurocêntrico e que promove o colonialismo,
evidenciando a exclusão abissal que existe entre o Norte (representa a razão
universal, geral e única válida, razão metonímica) e o Sul (representa a
realidade das desigualdades sociais, o pluralismo jurídico). Nesse sentido, o
processo que teve a não reintegração de posse como decisão final atendeu às
necessidades de reparação social do Sul, e não se submeteu à negligência às
desigualdades sociais que o Norte propõe.
No voto do
desembargador revisor Mário José Gomes Pereira, é apresentada uma frase de Luiz
Edson Fachin (“A liminar que seja deferida concedendo a reintegração de posse
do imóvel nessa condição pode até atender a dogmática do Código Civil, mas se
choca com o novo texto constitucional” – p.16) que simboliza a importância da
decisão para o Movimento Sem Terra (movimento que representa a luta pela
diminuição das desigualdades sociais), pois nega a dogmática do Código Civil
(de 1916, vigente na época) ao se recusar a negligenciar as desigualdades
sociais e a obedecer a razão metonímica imposta por tal dogmática. Ao invés
disso, atende à Constituição de 1988, que tenta reparar essas desigualdades.
O mesmo
desembargador declarou em seu voto que a propriedade é um direito fundamental e
um dever também fundamental. A propriedade que estava no processo não tinha
documentos atualizados que provassem que cumpria sua função social, conceito
estabelecido no artigo 186 da Constituição. No entanto, os autores do processo
tinham documentos desatualizados que provavam que a terra possuía produção de
milho, soja, trigo e criação de gado; sendo que, segundo o desembargador
relator Carlos Rafael dos Santos Junior, a “prova mencionada, ademais, poderia
ter sido obtida pelos proprietários da área muito antes do conflito instalado”
(p. 11).
Com as
constatações dos desembargadores, nota-se que o Direito não se submeteu a uma
posição eurocêntrica e a uma lógica herdada da época colonial de produtividade,
e sim que atendeu às necessidades locais. Neste processo, o Direito não se encaixa
na monocultura jurídica, sendo esta definida por S. Araújo como algo que
“despreza os Direitos locais e os universos jurídicos que regem formas de
produtividade não capitalistas e classifica como irrelevantes, locais,
improdutivas, inferiores e primitivas as formulações jurídicas não modernas”
(p. 10).
Isabel
de O. Antonio - matutino
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